‘Merlí y los peripateticos’ (na Espanha) é uma série feita
para a TV catalã que foi rodada em horário nobre (horário em que no Brasil
passam os ‘novelões’ e suas tramas exagerados, cheios de clichês e idealismos),
e diferente das chamadas ‘grandes séries’ que envolvem altos investimentos, não
aposta tanto no quesito técnico nem em personagens ‘idealizados’ (heróis e
afins), ideologizados por imagens e atos fantasiosos. Merlí, esteticamente, é
bem mais simples que isso. Disponível na Netflix, é dividido em três
temporadas. O que diferencia o seriado dos outros, além da questão já dita
aqui, são as temáticas levantadas em cada capítulo. Personagens fortes e grandes
atuações, o seriado é rico em simbologias, relações humanas, críticas sociais e
culturais. O centro da história é a filosofia. Ou seja, cada capítulo traz um
filósofo ou filósofa e alguns elementos que caracterizam seu personagem, o que
vai permear aquele capítulo e envolver os personagens e seus cotidianos na
trama. Coisas da vida que realmente acontecem, e que, muitas vezes não notamos
por estarmos dentro da situação. Quem escreveu o seriado foi muito feliz nisso.
Não há muito o que dizer de Merlí, pois o muito pode ser
pouco, ou nada. Final surpreendente (aliás, a surpresa é elemento comum durante
todo o seriado, pois como a vida, muita coisa muda sem aviso prévio). Um
professor (que pode fazer toda a diferença na vida de seus alunos), uma área do
conhecimento (que envolve outras), os alunos e a escola, estes são os elementos
centrais da ‘estória’. Por isso, indico a série
para professores e estudantes – e para todos/as os/as que se interessam pelo
pensamento, pelas relações humanas e sociais, pela vida tal como ela é ou pode
ser. Para assistir Merlí com um olhar mais profundo, é preciso livrar-se do
adestramento, do vício que se transforma em pré-conceito, que as superproduções
inculcam ao olhar.
Merlí é mais que um seriado, é uma aula de
filosofia, sociologia, psicologia, de como ver a vida de forma diversa,
abrangente, cheia de conflitos, movimentos e mutações, além da moral (ou
moralismo), do politicamente correto, do bem e do mal e dos idealismos. A vida
tal como ela é – ou pode ser. Um misto
de alegria e tristeza sinto em terminar o seriado que, tem na tragédia (ou
dificuldade), como diria Nietzsche, um motor para a superação do próprio eu. O
seriado é uma desconstrução do olhar viciado em certo idealismo, e seu final
uma celebração à memória e à vida.