segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Leituras do Cotidiano

O jogo das elites e a miopia dos reprodutores

Atentado a bomba no Instituto Lula e invasão destrutiva no diretório do PT em São Paulo, demonstram o nível de certa oposição ao governo federal.

FHC declarou que, se Dilma renunciasse seria um 'gesto de grandeza'. Eu diria que um 'gesto de grandeza' seria ele parar de revanchismo e hipocrisia, reconhecendo que, mesmo com todas as falhas, problemas e desequilíbrios, só com os projetos sociais e incentivos culturais, os governos Lula/Dilma foram mais abrangentes do que os seus e da maioria dos seus antecessores, e que fosse coerente e sincero, considerando em seus discursos que, o governo do PT é 'compartilhado' com outros partidos, inclusive o mais 'poderoso' deles no Brasil, o PMDB.

Se a corrupção é o grande problema do país, que se inclua neste discurso opositor, os partidos que estão no topo da lista de mais corruptos, onde, entre eles figuram o PP, o DEM e o próprio PMDB, estando o PT lá pelo 10º lugar. Então, porque o PT? As 'elites' do país ainda não aceitaram a 'democratização do capitalismo' (acessos das 'classes' mais baixas aos bens de consumo e espaços como aeroportos, shoppings, universidades, etc.) - e ao contrário do que o 'discurso' ideológico diz e ignobilmente é reproduzido, não se trata de comunismo. Ou seja, não é a corrupção, não é a má administração, não é a 'ameaça comunista'. É a não aceitação de certa realidade, a 'sede vingativa' e a tentativa de derrubar uma sigla e dois nomes o que coloca em risco toda uma nação e um projeto de país que, por mais capenga que seja, teve, além das faltas, seus avanços significativos (sob tudo nas áreas humanas - e este é o 'problema' que a oposição e seus 'reprodutores' combatem, um intencionalmente, outro cegamente).

Enquanto isso, Dilma se pronuncia a favor do 'direito de manifestação' com 'tolerância e diálogo', não com 'ódio, revanchismo e violência'. Ou seja, quem está sendo o quê neste jogo?


Obs.: Eu, Herman G. Silvani, professor de humanas e sociais e cronista deste jornal, declaro publicamente que não sou filiado em partido ou ideologia alguma - mas também não veria problema em ser, porém, não sou - por mais que ‘já tenham me filiado em muitos’, e ‘antes que venham me filiar novamente’, deixo assim declarado. Obrigado!


* também publicado no jornal Gazeta de Chapecó.



sábado, 8 de agosto de 2015

Bolsonaro, Rodrigues e Peninha em Xapecó: trio ‘di bem’ e tiros...

Rogério ‘Peninha’ Mendonça (PMDB) e seu ‘Estatuto da Legítima Defesa’ rendeu em Xapecó um Centro de Eventos com muitas cadeiras ocupadas e aplausos idólatras, principalmente pela presença do ‘arauto conservador’ e membro de um dos partidos líderes em corrupção no país, o deputado Bolsonaro e seu ‘fiel escudeiro’ o deputado oestino e ex-‘prefeito de verdade’, João Rodrigues. Na plateia um público sedento por ‘resoluções arcaicas’ dos problemas socioculturais de que eles também fazem parte, pois o crime é carregado de questões culturais, educacionais e sociais, sendo que, a sociedade é um todo.

No momento, Bolsonaro aproveitou e fez o palco do teatro ‘público’ do Centro de Cultura e Eventos (e agora também Palanque político), um palanque eleitoreiro. Sua ‘pré-candidatura’ a Presidente do Brasil foi lançada neste ‘palco-palanque’, no fechamento de um discurso inflamado que gritava o chavão nada original: ‘Fora Dilma! Fora PT!’, em que foi ovacionado pela maioria presente e pelos políticos e autoridades locais que o cercavam. Que orgulho para a nossa cidade, capital do ‘velho e bravil Oeste!’.

A partir deste ‘fato histórico’, teço algumas breves ‘análises dos discursos’ destes ‘ilustres cidadãos de bem’:

Palavras de Jair Bolsonaro (PP):

“O que o governo quer é deixar o povo na situação de cordeiro, sem possibilidade de reagir, e um povo desarmado é um povo subjugado”.

·         Apontar, mais uma vez, o dedo para cima, culpando ‘o governo’. Mas quem é este ‘governo’, já que, os senhores são deputados e, portanto, fazem parte dele? Por que é que os deputados não defendem outro tipo de armamento? Ou seja, mais educação e cultura, arte e conteúdos dignos? Neste contexto, aí sim o comentário do Sr. Bolsonaro faria sentido. Como estudante/praticante, pesquisador e instrutor de uma ‘arte marcial’ que é tida como uma das mais significativas em ‘defesa-pessoal’ ou ‘autodefesa’ do mundo (Wing Chun), pois é ‘proativa’, antecipatória ou preventiva, posso dizer que uma arma não garante nada, e que, na imensa maioria dos casos, armas são mal usadas e colocam pessoas mais em risco do que as salvam. Portanto, isso não passa de um discurso. Não é pelo final que se tem bons resultados (reação física), mas pela antecipação do problema, o que requer de outra consciência e estratégia. Não é com mais violência ou ameaças, mas com inteligência e sensibilidade que se resolvem problemas. Liberar desta forma o uso de armas de fogo é o mesmo que jogar gasolina numa fogueira. Estupidez dos senhores deputados ou interesse populista?

“Todas as ditaduras do mundo foram precedidas por campanhas de desarmamento. Isso que está em jogo (...) nesse viés do desarmamento”.

·         Este comentário é uma falácia ideológica (buscar ‘falácias’ na filosofia), pois indiretamente está supondo que o governo atual (Dilma e PT) querem manter o estatuto do desarmamento para, sem ‘reação’ do povo (dos ‘homi di bem’), possa implantar sua ‘ditadura comunista bolivariana’ no Brasil. Um discurso enfadonho que chega a ser cômico, mas que leva muita gente ‘ingênua’ (ou ignorante) no papo. 


João Rodrigues (PSD):

“Não podemos tolerar em Chapecó, nesta terra do bem, que meia dúzia de babacas, de idiotas, tentem se manifestar de forma truculenta. E isso não vamos permitir jamais”.

·         O velho jeito político de se autoproclamar ‘a voz do povo’ ou o ‘dono do pedaço’: ‘Não podemos tolerar (...) não vamos permitir jamais’, acompanhado com o discurso malandro do ‘bom sujeito’: ‘nesta terra do bem’. Ser leve para logo em seguida mostrar as garras e o ímpeto ofensivo: ‘meia dúzia de babacas, de idiotas’.

“Não quero andar armado na rua, até porque não tenho equilíbrio suficiente para andar com uma arma na cintura. Eu tenho arma em casa para que, se minha casa seja invadida, o sujeito obviamente não saia vivo lá de dentro”.

·         Neste discurso, o deputado, com uma sinceridade típica (ou atípica), deixa claro (ou deixa escapar) que seu ‘equilíbrio’ é insuficiente para o ‘autocontrole’, assim como tantos cidadãos que, a partir do momento que portem uma arma, não hesitarão em usá-la, devido ao desequilíbrio ou descontrole emocional que afeta a maioria da população (sob tudo, masculina). Em seguida, o deputado declara que tem arma em casa e com certa prepotência deixa dito que, com certeza ‘mataria’ algum possível invasor, independente do contexto, pois generalizou ao dizê-lo.

“No meu caso, no máximo teria alguém que andasse comigo e tivesse a capacidade para isso.”

·         Neste comentário, afirma que ‘teria’ (terá ou tem?) alguém ‘capacitado’ para defender (ou matar?). Porque alguém ‘di bem’, dita íntegra, teria esta necessidade, de andar com guarda-costas? Algo não fecha nesta matemática. Ou sou eu quem não sabe fazer conta.

Enfim. Assim caminha a ‘coerência’, a partir da cultura, educação e política, em Xapecó e no Brasil.

Sem mais.

      Nem menos.



* matéria 'base' na integra: 

http://redecomsc.com.br/portal/noticias/politica/Louvado_ou_execrado_bolsonaro_e_recebido_calorosamente_em_chapeco__24691





Leituras do Cotidiano

Publicação e bom senso

          Alguns acham que, por escrever e ser publicado em jornais e outros meios sou jornalista. É fácil confundir cronista com jornalista. Mas tudo bem, respeito, considero e até admiro alguns jornalistas. Poucos, para ser sincero, mas dignos com a palavra, as ideias, informações, com a linguagem e a comunicação. Não que eu não goste de ser confundido ou comparado aos jornalistas, mas, é que, de fato, não sou. Já que toquei no assunto, tenho provocações e algumas críticas ao jornalismo e aos jornalistas, da forma que eles são, pelo menos em sua maioria, penso eu. Nietzsche, um dos meus mestres na filosofia pontua o jornalismo como uma ‘cultura’ superficial: "O jornalista, por seu lado, representa a pseudocultura, a aceleração, a indisciplina intelectual, a superficialidade, a imaturidade (...) é o que opina sobre tudo e sobre todos, o que fala de qualquer coisa, o que tem opiniões próprias, mas nada mais que opiniões (...) é o que se subordina às leis da moda, às demandas do mercado, ao gosto da opinião comum. E produz afetação, autossatisfação e opinionites, e a ilusão vaidosa de ter uma personalidade livre e um pensamento próprio e original." ('Nietzsche & a Educação' - Jorge Larrosa), o que sem generalizar, é claro, eu concordo (parcialmente). Também ‘dou’ opiniões quando ‘teço’ comentários escritos, análises, pensamentos, problematizações, provocações em forma de crônica. Porém, tenho plena consciência de que elas, as ‘opiniões’, quase nunca são ‘próprias’, pois, como sempre digo aos meus alunos, elas provém de algum outro lugar, para além do ‘eu’ ou da ‘ideia’ pessoal. A filosofia (pelo menos aquela que defendo e promovo) tende a superar a mera opinião. O que existe são as ‘referências’ e ‘conteúdos’ que, sintetizados ou não, geram outros conteúdos e impressões. Eis o fundamento de escrever e publicar. Nada vem do nada em se tratando de conteúdo escrito ou dito. Por isso, é fundamental certa sensibilidade, certo primor no uso das ideias. Para isso, além  das leituras e estudos, é necessário o bom uso dos sentidos. Sentidos apurados e bem tratados. Nisso, intuição e instinto, além da razão, devem ser considerados. Ou seja, respeitar, compreender, relevar e considerar a natureza, além do fator cultural. Um equilíbrio entre natureza e cultura pode gerar um pensamento mais, digamos, interessante e livre, e menos doutrinário ou segmentado. Superar o dualismo platônico que resulta em determinismo e reducionismo da ideia, do pensamento, da palavra e da linguagem, é o caminho para um ‘publicar’ (compartilhar ou socializar) mais dinâmico e coerente com a amplitude e profundidade do mundo. Nietzsche também diria que "Para ler bem, é preciso ter todos os sentidos afiados" (e leia-se 'ler' aqui como 'leitura de mundo', para além das páginas impressas). Nisso, o jornalismo, geralmente peca. Se não dá para aprofundar o conteúdo publicado, que pelo menos se aponte as referências para uma busca mais profunda, ou se permita isso através do bom uso da linguagem. Eis que, com isso, sigo a risca um ensinamento de outro mestre: "Nunca teste a profundidade de um rio com os dois pés" (Confúcio), para que eu tenha pelo menos, minha parcela de ‘bom senso’ naquilo que publico garantida. 



* também publicado no jornal Gazeta de Chapecó.



domingo, 2 de agosto de 2015

A luta entre Ronda e Bethe: para além do ‘espetáculo’...

Acabei assistindo outra luta de MMA entre a brasileira Bethe Correia (que entrou no ringue ao som do funk ‘Beijinho no ombro’ de Valesca Popozuda, em que também foi anunciada como faixa azul de Jiu-Jitsu e roxa de Kung Fu) e a americana ícone-modelo ‘pop’ do MMA/UFC, Ronda Rousey. A brasileira que depois de fazer provocações na mídia sobre o suicídio do pai da sua oponente foi nocauteada rapidinho. Provocações que alimentam os rumores, aumentam a disputa e incentivam a audiência do ‘espetáculo’ midiático acima do MMA – e todos/as saem ganhando com isso (ou quase todos), sob tudo, as marcas patrocinadoras, a empresa UFC e os veículos midiáticos transmissores.

No discurso do anúncio da luta, o locutor esportivo da Globo disse que a brasileira, por escolher aquele funk , ‘representa bem o Brasil’ (a autora também já chamada pela mesma mídia de ‘filósofa’). Que Brasil é este representado? Uma falácia clichê e legitimadora de um discurso, pois o Brasil não é isso, assim, deste jeito – ou só isso. Apresentada como ‘lutadora’ de Kung Fu, a brasileira provocou, entrou dura no ringue e fez sua parte no ‘show’. O Kung Fu foi citado, mas não foi visto (pelo menos eu não vi nada de Kung Fu) nesta sua participação do espetáculo, começando pela falta de respeito e aparente ‘braveza’ (lembremos que disputa e porrada dão ibope numa cultura dualista e violenta como a ocidental – é só perceber as telenovelas e suas audiências cheias de intrigas e coisas do tipo). Se houvesse Kung Fu na participação da brasileira, ela haveria pelo menos saudado a ‘oponente’ (ou ‘colega’ de ‘arte marcial’, ‘profissão’ e/ou ‘modalidade esportiva’).  Só houve, por parte das duas, cara feia e olhar de ira de uma para outra. ‘Coisa linda de se ver!’ (é realmente necessário a ‘cara feia’ nestas lutas?). E aqueles conceitos comuns feitos frase clichê nas escolas e academias ditas ‘marciais’ por aí de ‘respeito, disciplina e humildade’? No fim da luta, o também brasileiro-lutador conhecido por ‘Cigano’ disse que Ronda foi ‘perfeita’, mesmo desferindo alguns socos no ar. Certamente foi melhor em tratando-se da ‘luta’ (inclusive venceu, é óbvio). Mas ‘perfeita’? Perfeição não seria algo exatamente correto, sem erros? Mais um conceito, uma reprodução de ‘senso-comum’ a partir de certo idealismo platônico, comum no discurso corrente.

Meu olhar sobre tudo isso não é ‘a verdade’ (não se trata disso). Apenas um olhar de quem, além de estudante e instrutor de Kung Fu, é professor de filosofia, história, sociologia e linguagem, e que também se aventura pela música e estudos culturais. Ou seja, só falo do que falo ou escrevo, devido a este meu ‘trânsito’ pelos temas que integram meus estudos e ofícios.

A razão deste texto, é devido ao fato de eu ter sido perguntado por mais de uma pessoa sobre o que achei da ‘luta’.

Se for falar só da luta em sim, achei feia mas ‘eficiente’ (deu certo). Vi uma fera agressiva indo pra cima de outra que, também agressiva, não teve chance de revidar. Simples e direto assim, por mais que me falem em ‘técnica’ e tudo mais. Eis a incógnita entre luta, espetáculo, arte marcial e esporte. Alguns defendem que MMA é tudo isso, outros acham que não. De minha parte, voto em primeiro lugar no ‘espetáculo’ (leia-se ‘sociedade do espetáculo’ a partir de Debord), depois na ‘luta’, seguido pela ‘violência’ (que vende e é consumida em grande escala na nossa cultura), depois ‘esporte’ (o que muitos questionam que seja), e por fim, ‘arte marcial’, pois de ‘arte’ (enquanto linguagem manifestada com intensidade e sensibilidade) não vejo quase nada, e ‘marcialidade’, um pouco mais, mas também muito pouco, pois ‘guerra’ é outra coisa, diferente de uma ‘luta’ regrada e cercada entre duas pessoas que disputam, sob tudo, um status. Acho que assim dou algumas respostas para questões que me foram feitas.

Como vivo com e das minhas ‘funções’ (já citadas acima), minha leitura não haveria de ser diferente (ou haveria?). Questão de coerência com aquilo que se faz, se estuda e se vive.


Obs.: A intenção do texto não é deplorar as lutadoras, o entretenimento em si, ou a ‘arte marcial’ em questão, apenas analisar fatos como estes a partir de outro ‘olhar’, já que no discurso corrente midiático, tais elementos - filosóficos, sociológicos e culturais – são (foram) citados.