quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Viva a ‘nossa liberdade’! (?)




Escolha a sua liberdade, ela está em liquidação. Ponta de estoque. Temos duas boas opções. Uma delas te servirá bem: liberdade demo-crática ‘a la grega-platônica’ ou a liberdade econômica ‘a la iluminista-francesa’ – tens opção, veja só, ‘é a democracia irmão!’. Que o diga o bispo Mala-faia e sua liberdade de culto (culto ao que? – ah, você deve saber, não sabe?). A liberdade dos povos nativos e/ou tribais não interessa ao eurocentrista-civilizado, pois ela é outra e não tem relação com a propriedade privada ou com o capital, então, descarte. Enquanto a blogueira cubana Yoani Sanchéz é tida como um ícone da tal ‘liberdade de expressão’ e faz sua visita ao Brasil na ‘sua luta democrática pela livre expressão’, sendo a estrela da vez de ‘meios de informação de massa’ que também alimentam tais e tais conceitos e discursos de liberdade e democracia, como a revista Veja e o telejornalismo da Globo, Julian Assange e seu Wikileaks são por estes soprados distante, como pó - nossos ‘neutros’ (ou neutralizadores?) meios de comunicação (ou reprodução?) de massa. Ah, mas nós somos tão ‘democráticos’! Nossa magnífica programação de televisão aberta e ‘popular’, com seus Big Brothers, seus vários programas e canais religiosos de pregação capital, seus ‘neutros’ telejornais e afins, nossa opinião pública (ou publicada?), nossa educação exemplar, onde professor é chamado de vagabundo por um governador que representa o latifúndio enquanto coisas incendeiam por aí, etecétera... Uma festa! Um circo com migalhas de pão! E nós, nos fartamos com isso, preocupados - sim, claro! - com a condição dos nossos ‘irmãos-negros’ latinos-cubanos – e o Neymar e o Renan engordam suas contas e enchem seus semblantes de alegria! Foi Cuba quem promoveu o neocolonialismo na África, que bloqueia países ‘pobres’ dos acessos básicos de vida, que ‘invade’ territórios alheios num discurso ‘libertário-democrático’ contra o ‘eixo do mal’ (ou seus interesses capitais?), que dá muitas das cartas do baralho na jogatina política mundial... enfim. Agora esse papo me encheu o saco e eu vou fumar meu charuto paraguaio e beber meu rum caseiro,  enquanto a 'ícone cubana pop pró-democracia' faz turismo pelo mundo, e 'bem acompanhada' com certos políticos, curte o 'lado A' do Rio de Janeiro (Copacabana e afins) - será que vai curtir também o 'lado B' dessa 'história', dando um role pelas favelas cariocas? Assim ela poderá degustar de 'outra forma' da nossa 'paradisíaca demo-cracia liberal' e afinar a sua 'luta' em prol desse 'modelo de liberdade seletiva'. Enfim... Contudo,  VIVA A NOSSA LIBERDADE assistida e espetacular!

Herman G. Silvani






















quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Olhos para o mundo


















Olho nos olhos quando quero a verdade. Olho pro chão quando quero fugir da verdade e pro céu quando não quero nada. Nos olhos estão as vontades, as necessidades e as virtudes escondidas. Nos olhos do assassino dá pra ver seus medos. Nos olhos do poeta, todo o tédio pelo mundo. Tédio que o faz compor seus versos. Nos olhos da doméstica todo o seu cansaço e no do doente, toda a sua angústia. Olhos são janelas para o mundo. Olhos são janelas de um mundo para outro. Fecho os olhos quando quero que o mundo desapareça e os abro quando quero que ele aconteça. O mundo acontece o tempo inteiro diante dos meus olhos abertos e deixa de existir quando meus olhos se fecham. Todo o carinho que necessito para continuar sendo humano está nos olhos dos que me amam e dos meus cães.

Uma criança me olha enquanto eu falo. Chama pelo meu nome e quando atendo, não diz uma só palavra. Pelos olhos ela fala, e seu olhar é terno, sereno, verdadeiro. Um olhar que dispensa conceitos, interesses, intenções. Há poesia no olhar da criança como há sorriso no olhar dos cães.  Há dor no olhar dos que criam, há alegria, há esperança, há vida. Há ódio no olhar dos que ambicionam poder. Há frustração no olhar dos que invejam, acomodados em suas decepções por não terem um pouco de caos dentro de si. Há música no olhar dos velhinhos que adoram dançar descalços, contarem causos e rirem da vida que passou, sabendo da pouca que ainda resta. Há brilho no olhar dos que lutam por uma humanidade que ainda não chegou e talvez nunca chegue. A luta, mesmo nunca sendo branda, traz em si uma alegria libertadora que faz o sorriso ser pleno. Alguém me disse um dia que tenho certa tristeza no olhar. Mas não o tempo todo. Sofro de sensibilidades agudas, mas não tento matar a tristeza nem tampouco evidenciar a alegria que também existe em mim. A natureza me fez assim. O mundo me fez assim. E eu vejo o mundo com os olhos que sou. 


sábado, 16 de fevereiro de 2013

O ano da Serpente & o eterno carnaval...


2013 começou ‘punk’! No calendário chinês é o ano da serpente. Ano passado foi o do dragão, mas parece que a serpente é tão radical e ágil quanto o símbolo ‘maior’ da ‘cultura mítica’ chinesa. Nasci no ano da serpente e algumas das minhas características relacionadas a isso não negam o fato. E chegamos e passamos pelo carnaval (a festa da carne) que, diga-se de passagem, de certa forma continua, e de certa forma, é o mundo – um grande carnaval! Enquanto ônibus incendeiam por todo o Estado e o governador, num ‘desvio de conduta’, se pronuncia fazendo querer parecer que isso não é coisa do crime organizado, em Xapecó - e sua tradição incendiária - ônibus das empresas de transporte ditos ‘públicos’, são escoltados pela política militar e municipal. Por aqui, igrejas, clubes sociais e até pessoas (forasteiros) já foram queimados um dia (leia-se o livro ‘O linchamento que muitos querem esquecer’ de Monica Hass). Nisso, a dita ‘bandidagem’ deve ser um bloco de carnaval que sai pulando e queimando - ou vive camuflada por detrás de brasões, instituições, ordens secretas, nomes de famílias, etc., por aí. Entre incêndios e tragédias, o ano da serpente também começa com o anúncio da renúncia do Papa – e Exu dá mais um tapa no seu charuto soprando uma fumaça ancestral no ar. Nisso, a serpente se mostra um dragão de menor porte, porém, astuta e não menos letal. O futebol mundial aparece como uma das maiores máfias do mundo, onde jogos e resultados são comprados, e o ‘torcedor fanático’, assim, imbecilizado. ‘Mas no hay pobrema! El mondo es una cosa loca’. Na Bolívia, o presidente (descendente indígena) cria a digna ‘Lei da Mãe Terra’, a primeira legislação mundial dando à natureza direitos iguais as dos humanos, enquanto isso, do outro lado do ‘jogo’, capitalistas desenvolvimentistas discursam a favor de um dito ‘progresso’ a qualquer custo – e o carnaval prossegue, e a maioria samba e dança conforme a música. A serpente não! A serpente é rápida, se move conforme a situação e tem um veneno que pode ser mortal. Não é feroz, porém, quando ameaçada, se defende, e sua defesa, geralmente é um ‘contrataque’. O ano da serpente recém começou, e temos tanto ainda pela frente – onde muito é alegoria, neste eterno carnaval...


* também publicado no jornal Folha do Bairro - 15/02/13




sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Do que somos feitos?





















The Prisoner (Boulet) - Odilon Redon, 1879


Cérebro, coração, pulmão, estômago - e, além disso... Somos carne, voz, sentimentos, razão. Somos constituídos por tudo o que o meio nos oferece, pelo que nos circunda nesse meio e pelo tempo. O que consumimos nos torna a ser, já que somos consumidores – nossa condição. Consumimos muito do que vivemos e pelo tempo somos consumidos. Numa reportagem de televisão – por uma emissora de cunho religioso - jovens bebiam numa balada na praia. Sertanejo universitário, eletrofunk, eletrobrega, breganejo, etc. Rodeados de latas de cerveja e muitos outros lixos tombados, os jovens, alguns de pé, outros cambaleando - e outros também tombados, misturavam-se ao lixo e a toda aquela música que também, por alguns, é tida como lixo industrial. E a reportagem sensacionalista fazendo uma relação com a dita ‘tragédia de Santa Maria’. Nisso, em algum momento um bispo ou pastor, como queiram, citou o conto bíblico de Sodoma e Gomorra, relacionando-o ao fato. E eu, um pouco pagão, um pouco de fé - ou muito de nada disso – eis que resolvo problematizar tal questão.


Fui nascido na cidade, criado divagando entre o interior sem energia elétrica e a cidade grande e iluminada, além da estrada em viagens com meu pai. Foi nessa condição ‘privilegiada’ que aprendi a ser - dentro de variadas situações, circunstâncias, realidades ou contextos. Nessa diversidade dos meios, foi que aprendi, desde muito cedo, que somos feitos (além da questão biológica) daquilo que consumimos, ou seja, de tudo o que vivemos, aprendemos, saboreamos, ao longo da nossa vida – mas é claro que nem todos absorvem as coisas com senso crítico ou certa sensibilidade. Grande parte das pessoas apenas absorve e depois reproduz. Mas tem aqueles que nunca se param satisfeitos com aquilo que lhes chega – e eu sou um desses. Também bebo, também como, também leio livros, ouço música, canto, danço e assisto TV, e não é por isso que sou medíocre, mesquinho, nem tampouco um mero reprodutor. A pergunta que deve ser feita frente ao espelho: ‘O que eu consumo?!’. Eu crio, eu arrisco, eu caminho para além dos limites estipulados nessa ordem que condiciona e fabrica ‘iguais’ que consomem e se misturam ao consumido. Valorizo as diferenças, os meios e caminhos alternativos, pois os conheço, pois os dou a devida atenção. Busco e transito para além do habitual. Esse negócio de dizer que o problema nas baladas é culpa unicamente da bebida ou da droga é um desvio. Mais que isso, somos feitos de referências, de tudo o que vivemos, ouvimos, lemos, assistimos, escolhemos para nossa convivência. Somos seres culturais, portanto, um tanto responsáveis pela nossa própria condição – para além das fatalidades... 'Somos feitos de mundo!'. 


* Também publicado no jornal Folha do Bairro (do grande bairro Efapi) - 08/02/13