“Quem luta com
monstros deve velar por que, ao fazê-lo, não se transforme também em monstro. E
se tu olhares, durante muito tempo, para um abismo, o abismo também olha para
dentro de ti”. (Nietzsche)
Já tive amigos ou
conhecidos admiráveis, sobre tudo, sob o ponto de vista da razão, da
perseverança e talento em reagir. Amigos ou conhecidos que se somavam ao riso
da vida. Mas hoje, muitos desses amigos ou conhecidos, outrora admiráveis pelas
suas alegrias criadoras, suas vontades de potência, rendem-se ao niilismo.
Alguns deles ao niilismo ativo, outros, ao passivo. Niilismo, no sentido de
‘negação’ da alegria da vida, negação do fazer-se na vida enquanto caminho sem
fim. Amigos que entoavam suas canções positivamente e que agora nem sequer cantam
mais, apenas pestanejam, e ruidosos, fazem da crítica, no máximo, lamúrias.
Olham tão fixamente para o abismo que não conseguem mais ver o mundo como um
caminho possível. Tão fixamente que o abismo passou a também a olhar para eles.
Nessa luta contra monstros, acabaram tornando-se monstros também. Hoje,
justificam suas frustrações com ‘justiçamentos’ ignóbeis, gritando a favor das
mais estúpidas violências e bafios valores, como se fossem curas para uma chaga
incurável. Não consigo sentir pena deles. Apenas sinto suas faltas, no máximo.
O abismo engoliu seus sonhos, suas vontades e suas alegrias. Trocaram o caos
criador por uma convicção traidora, uma certeza, uma verdade que lhes tornou
simplesmente queda.
* também publicado no jornal Folha do Bairro, 28/03