sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Concebido numa tarde ociosa...

















('Vision' - Odilon Redon)


Sempre que vem alguém dizer ‘você está  bem hoje’, é porque num outro dia você não estava bem. Outro dia, alguém veio e disse: ‘Herman, você está estranho hoje!’. Isso me deixou tranqüilo, pois, dentro de certa lógica, significa que, normalmente, não estou estranho. Guardadas as proporções e relatividades disso tudo, cada dia é um dia e a cada dia o estado de espírito se comporta diferente. Quando alguém vem e fala: ‘O que foi?’, sem ter nada sido, algo está errado. E se não é contigo, certamente é com quem perguntou, pois essa dúvida, essa desconfiança, esse receio, vem do questionador, neste caso. Você está na sua e só porque o outro acha que ‘você está diferente hoje’, você tem que ouvir e, às vezes, até pensar sobre isso. Isso tudo só quer dizer que a realidade nem sempre é perfumada e que as coisas geralmente não são o que parecem ser, além de que, as pessoas observam muito nas outras, mesmo não sendo boas observadoras ou interpretes, pois, geralmente também, erram muito nas suas percepções. Então, assim idealizam suas próprias realidades para poderem tentar entender, ou achar que entendem da realidade do outro a partir da forma ou expressão corporal ou física, como que se a alma falasse através do corpo. Já pensaram em olhar para os olhos? É através deles que a alma se manifesta ao mundo exterior. Bem, pelo menos eu acredito que seja.


* também publicado no jornal Folha do Bairro, 29/11



quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Leituras do Cotidiano - 28/11

PSD (des)agregando valor no camarote do PT...














Não, não sou jornalista. Mas vou dar uma de tal agora:

Extra! Extra! Notícia Bombástica! PSD formaliza em Brasília apoio à reeleição de Dilma!

"Acreditamos que o melhor para o Brasil é a continuidade do governo Dilma Rousseff" (Kassab) - "A senhora tem mostrado todas as qualidades pessoais para levar o país adiante" (Raimundo Colombo)... E o discurso muda do dia pra noite, rapidinho! Alguns 'esquerdistas' já dando 'boas vindas' aos novos 'aliados'. As perguntas que não querem calar: 'O que levou o PSD declarar apoio ao PT?' E 'o que leva o PT a aceitar essa aliança pós, ultra, mega, hiper, supra moderna?' 

Para rememorar, ou pra quem ainda não sabe, o atual PSD, é uma 'dissidência' do DEM, que a pouco era o (extinto) PFL, e que antes de sê-lo, era a ARENA, a extrema direita de caráter nazifascista, partido da 'ditadura militar'. 


Entrevista de crianças que 'se formaram' no Proerd:

- Aprendi que... drogas fazem mal pra saúde...

- Aprendi que... é pra ficar longe das drogas...
- Aprendi que... é pra ficar longe das drogas e da violência (como se isso fosse uma escolha tão simples assim)...
- Aprendi que... drogas fazem mal pra saúde...

Penso: Será que o Estado e seus 'servidores' (polícia, neste caso), realmente sabem algo sobre 'drogas'?


Mania e febre...

Se você acha que escrever em jornais é incompatível a boa literatura e a filosofia, sinto em informar-lhe, mas foram em jornais impressos que grandes mestres da prosa, poesia e do pensamento expressaram suas palavras e ideias, e a crônica é um bom e digno caminho pra isso. Não que eu seja um grande mestre, ou que esteja a caminho disso, mas, há algo maior do que a ruminação em torno daquilo que pode e não pode, deve e não deve, é ou não é. Digo isso, pois tem ‘escritor-filósofo’ por aí, achando que seu blog ou facebook são mais valorosos do que uma simples coluna em um jornal qualquer. Acometidos por uma febre platônica, pensam estar além dos espaços cotidianos. Mania de idealista que não consegue perceber sua própria mediocridade.  Conste...




* também publicado no jornal Gazeta de Chapecó, 28/11



sexta-feira, 22 de novembro de 2013

É necessário...














Sexta-feira e acordo antes do horário. Que droga! Preciso trabalhar e ainda não está na hora. ‘Produzir é necessário!’ É sempre o que ouço todo maldito dia da boca grande do chefe. Um saco! Um dia desses eu juro que dou uma porrada no ‘boca grande!’ Tenho praticamente duas horas antes de bater o cartão. Até lá não posso mais dormir. Se dormir, não acordo mais. Parte da noite passada passei bebendo e jogando conversa fora com Patrícia. Ela é um pouco complicada, mas sua companhia acaba sendo sempre agradável. Depois que ela foi embora, toda torta e com a cabeça cheia de rum e cerveja, a solidão bateu a minha porta. Não se importando nenhum pouco com o que eu achava, se sua presença era boa ou não, a solidão veio com tudo. Um pouco bêbado, mas ainda não de cara cheia como Patrícia quando foi embora, passei a mão na máquina de escrever e numas folhas brancas que sempre tenho dentro de uma caixa no chão no canto do quarto. Sentei na minha escrivaninha velha, herança do meu avô paterno, e seguindo os conselhos do meu chefe bocudo, comecei a escrever, pois: ‘Produzir é necessário!’. Quis um poema, mas saiu um conto. Não teve jeito. Acho que a poesia me abandonou – se é que um dia a tive. As palavras do chefe batem forte na minha cabeça enquanto um conto desumano e violento contra o emprego e o chefe e a favor da mulher e da filha do chefe, da sua irmã e sua mãe, nasce. Senti prazer em torná-las parte da minha festa de cabaré, enquanto ele e o emprego ficavam trancafiados num porão escuro, sem água nem luz, repetindo: ‘Produzir é o caralho!’. Pensando nisso me sinto melhor. E agora falta pouco menos de uma hora para bater o cartão e ouvir do ‘boca grande’ aquilo que vocês já sabem...


* também publicado no jornal Folha do Bairro, em 'dois patinhos' do onze...




quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Leituras do Cotidiano - 21/11

Somos ‘série A’...

‘Estamos na série A! Somos elite!’ - no futebol... Vejo/ouço isso na televisão, na internet, rede social, rádios, adesivos em carros, ruas, etc. Penso: pena não sermos também 'A' ou 'elite' na arte/cultura, educação, saúde, administração pública, política... Ao contrário: favoritismos, processos de cassação, desleixo, dívidas públicas, omissões, falta de justiça, homicídios mal suicidados e outras tentativas, motivos para greves e outras reclamações, etc., fazem de Xapecó, série 'C, D e E' em vários aspectos. Enquanto isso, 'pão e circo' para o povo! A cada grito de gol o imperador ri, discursa e comanda. Mas o grito, assim como o gol, assim como o futebol e sua série 'A', não são o problema. O problema é o grito contido, interno, sem voz. Aquele mais sufocado do que o grito de gol. Espero (mas não parado) que um dia, também sejamos série 'A' em questões mais emergentes e fundamentais.


 Greve! Prefeitura volta atrás!?   

Agora fica fácil, depois da 'derrota' do poder público frente à greve dos servidores, voltar atrás e discursar na mídia que 'falta entendimento dos funcionários' referente aos motivos da greve: ‘Depois que entenderem, vão ver como é bom e
aceitar, aí o projeto volta para votação’.

Sentido inverso: 'primeiro se impõe, depois acontece (a greve) - diz-se que ela é ilegal ou criminosa, volta-se atrás, e por fim, pede-se o diálogo'. Não deveria, democraticamente falando, ser o contrário? 'Generosa essa nossa administração, não é?' Depois de 11 dias de greve: 'voltar atrás' para rever, dialogar, 'ensinar' (dizer o que é bom ou não para os trabalhadores - será que os funcionários, incluindo professores, são de tão difícil compreensão assim?) Ou é pretexto de quem teve que recuar, mas não pode demonstrar isso?

Obs.: vigilância sanitária parada, indústrias de alimentos (frigoríficos) sem produção = prejuízos! E a pressão, eim Zé?! 


‘Honras militares’ para os restos mortais de Jango...

Chega a ser cômico (no limiar entre o cômico e o trágico)! O presidente que sofreu o golpe e tem suspeita de ser assassinado pelo regime militar, agora recebe 'honrarias militares'. O mundo, às vezes, parece uma piada feita por um deus pândego e maldoso que ri de tudo o que lhe falta...



* também publicado no jornal Gazeta de Chapecó



sexta-feira, 15 de novembro de 2013

República reeditada

A República nasceu em comum desacordo ou em incomum acordo, entre uma elite e o povo. A elite ficou com a terra e com o ouro, enquanto o povo... Bem, o povo até hoje, no ovo! A República foi velha, foi nova, e é velha de novo. Nossa reles pública! Nossa casa sem lar, nosso lar sem sentido, nosso sentido sem teto – e nossa glória sem terra. Somos ‘habitantes de cidades destruídas’, como bem canta José Paes de Lira – onde veículos afogam bicicletas. Somos filhos de uma ordem e um progresso importados que excluiu a nação nativa em detrimento de uma nação inativa. A partir disso, fundamos espaços de adestramento a que chamamos escolas, faculdades ou universidades. Fundamos bancos, cartórios, câmaras, senados, sanatórios. Cenas de uma realidade forjada em papel assinado, documento legalizado, legitimado, feito! Trocamos curas por cruzes e promessas nunca cumpridas. Casas de oração e doutrinamento, igrejas e lojas maçônicas, entre a farda e o fardo, deram a direção do vento. E o vento trocou de nome. Seja ele monarquia ou república, seja ele deus ou diabo, são facetas do mesmo plano, cães do mesmo rabo. Um plano terreno, baixo, como um golpe, uma rasteira de capoeira, arte nobre, preta,  que ainda não se ensina na escola. A República não foi uma proclamação, nem tampouco uma revolução. Antes, uma reclamação, ouvida e tornada verdade. Uma verdade, sob tudo, duvidosa. Acredite quem puder!



* também publicado no jornal Folha do Bairro, 15/11



sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Entre o lixo e o luxo...

















Um ‘catador’, leitor desse escriba (que orgulho!), membro da Associação Cooper São Francisco, me enviou uma carta através do Folha, pedindo minha manifestação sobre a problemática atual referente ao lixo produzido em Xapecó. A carta começa destacando que “está vindo muito lixo orgânico” misturado ao reciclável, e eis um grande problema. Isso me faz lembrar de quando começou o programa de separação do lixo, nos primeiros mandatos do governo PT de Xapecó, que inclusive, foi uma das cidades pioneiras nisso no Brasil. A separação modificou significativamente a realidade e consciência socioambiental da cidade, e foi eficiente devido a uma massiva campanha de divulgação que incentivava tal ‘capricho’. E hoje, onde está esse incentivo, papel fundamental do poder público? A carta continua: “Também observamos que a empresa Tucano está coletando junto com o lixo orgânico o lixo seco. Isto causa um retrocesso socioambiental (...)”. O amigo ‘catador’ (ofício fundamental para uma ‘realidade mais limpa’), tem pleno conhecimento do que fala. Tiram ou diminuem o espaço das famílias que trabalham com a coleta e separação, terceirizando o serviço e deixando com que o lixo se misture e isso se torne uma concentração de renda. Com isso, e sem uma campanha de incentivo e conscientização para a importância da separação, andamos para trás. Em tempos de comprometimento com a vida no planeta, desleixos governamentais como este, são retrocessos, como bem avalia nosso amigo ‘catador’. Contudo, precisamos retomar essa questão e dignificar o trabalho alheio, assim como, o ar que as novas gerações vão respirar.


* também publicado no jornal Folha do Bairro, 08/11



quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Leituras do Cotidiano - 07/11

A ameaça vermelha continua?


Depois do ‘movimento libertador de 64’, ou seja, a grande revolução pelo bem estar do país e da família brasileira que afastou o ‘perigo soviético-comunista’, estabelecendo a ordem e o progresso nessa terra abençoada por Deus, tivemos alguns anos de desenvolvimento material, espiritual e de paz. Vândalos anarquistas e estudantes vagabundos que não queriam trabalhar foram devidamente punidos. A verdadeira cultura brasileira foi valorizada, assim como a decência das famílias. Graças a isso ainda temos um hino, uma bandeira e um país, onde a sagrada propriedade privada é garantida aos que trabalham e se esforçam para subir na vida – tanto que a ‘ordem e progresso’ está estampada na nossa grandiosa e magnífica bandeira! Graças a isso, somos o primeiro lugar na América Latina em... em... em... Naquele período, abolimos conteúdos subversivos nas escolas que usurpavam nossas crianças. Filosofia, história e sociologia foram transformadas em EMC (educação moral e cívica), OSPB (organização social e política do Brasil) e religião, disciplinas fundamentais para garantir nossa nação como uma nação livre do comunismo sanguinário e manchado com o vermelho do sangue até na sua bandeira. Esperar o que de uma bandeira que tem armas mortais estampadas na sua fronte? A foice, um instrumento rústico, de povos rústicos e selvagens, cortante se afiado, e o martelo, um instrumento de ferro que pode ser usado para quebrar crânios e matar gente, herança dos povos bárbaros que, a modo dos Sem Terra hoje, invadiram e pilharam propriedades alheias, na época da antiguidade, do magnífico Império Romano, maior exemplo de civilização que o mundo já viu. Graças aos nossos militares tivemos disciplina, decência, boa conduta, moral. Graças a eles também... também... também... Enfim. E hoje, o que temos? O perigo comunista voltou ao país com os governos do Lula e Dilma no poder. O PT que, depois de anos de radicalidade, abriu-se para a democracia de partidos limpos, puros e íntegros como o PMDB, e está se abrindo para o PSD também, precisa urgentemente se livrar do PCdoB (partido comunista – olha a sigla!), e conciliar seu governo com o PSDB. Aí sim teremos novamente, um desenvolvimento no... no... no... que... que... que... Enfim. A atual greve do funcionalismo público traz de volta à Xapecó a ameaça vermelha – outrora trazida por forasteiros que foram punidos exemplarmente. E as greves são armas mortais contra a democracia, culpa dos sindicatos que ainda tem práticas provenientes da antiga URSS e das China e Cuba, ditaduras comunistas que querem dominar o mundo. Enfim. Vamos rezar por nossos governantes, que eles mantenham distante de nós essa praga vermelha, essa ameaça. As futuras gerações agradecerão!

...e como dizem algumas crianças e alunos por aí: “só que não!”



 Obs.: isso não é uma ironia! Nem sarcasmo.


* também publicado no jornal Gazeta de Chapecó... (Obs.: ESSE TEXTO NÃO FOI PUBLICADO NESSA DATA, MAS, SERÁ, PROVAVELMENTE, NUMA PRÓXIMA EDIÇÃO - OBRIGADO!)



sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Negritude, memória, pimenta & prazer


Estive em Salvador, Bahia. Minha primeira vez no nordeste brasileiro. Uma rápida, porém, intensa experiência. Discuti, fiz política ou militei. Troquei palavras e risos. Reencontrei amigos e fiz outros novos. Mas também bebi, comi, andei. Fotografei o que pude e o quanto pude. Muita história, muita dor, muita vida e amor. Salve Salvador! Terra de gente! Gente que no corpo tem pele preta e no riso dente branco, que de tão branco reflete um algo de calmaria. Salve Salvador, terra de todos os santos! Terra de meu pai Xangô, de Oxóssi, Iansã, Nanã e Iemanjá – entre tantos! Terra de samba, berimbau e capoeira - mas não só isso. Terra onde o preto velho descansa seu tempo na rua e os cães transitam soltos por todo lugar, enquanto crianças correm empinando suas pipas com seus sorrisos de inspiração. Terra que, ao contrário do que muitos pensam, é feita de trabalho, sim, muito trabalho, mas não o trabalho que concorre e corre para a morte. Trabalho necessário, para a sobrevivência, sem entrega da alma ao acúmulo. Corpos que passam o tempo prestigiando a vida. Corpos que são prestigiados - no gingado da negra e do negro, na roda de samba, na descida do Pelourinho ou decaído na mesa do bar. Corpos que ardem, sofrem e cantam. Corpos que sorriem. A alma cheia de paixão e a vida que no riso se alimenta. Eu, no meio disso tudo, o estrangeiro que gosta de pimenta, fartado do prazer de um estar, e que agora também é um pouco mais...


(foto by Herman)


* também publicado no jornal Folha do Bairro, 01/11