Em 1960, Adolf Eichmann foi capturado na cidade de Buenos Aires pelo Mossad (Instituto para Inteligência e Operações Especiais de Israel) e levado até Jerusalém, para o que deveria ser o mais midiático julgamento de um nazista desde o tribunal de Nuremberg. Segundo a filósofa Hannah Arendt, durante o processo, em vez do monstro sanguinário, que todos esperavam ver, surge um funcionário, um burocrata. A partir deste fato, Arendt escreve sobre o que chamou de ‘a banalidade do mal’. Mesclando jornalismo político e reflexão filosófica, Arendt investiga a capacidade do Estado de igualar o exercício da violência homicida ao mero cumprimento da atividade burocrática: “Como condenar um funcionário público, honesto e obediente, cumpridor de metas, que não fizera mais do que agir conforme a ordem legal vigente?”. A partir dessa questão, a filósofa, explora as implicações do julgamento de Adolf Eichmann.
Apontado como um monstruoso carrasco nazista,
responsável pelo planejamento e operacionalização da chamada "solução final", a figura de Eichmann se
apresenta, diante de Arendt como um funcionário pronto a obedecer a qualquer
voz imperativa, incapaz de refletir sobre seus atos ou de fugir aos clichês
burocráticos. É nesse ponto que Arendt se depara com a confluência entre a
capacidade destrutiva e a burocratização da vida pública.
Uma relação com o tempo presente
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Brasil, Estado de Santa Catarina, 02 de dezembro de 2020. Deputados da bancada
governista obedecendo a pauta empresarial/governamental, reúnem-se às pressas
em sessão e aprovam a educação como serviço essencial: “...o projeto de lei que
define quais são as atividades que devem ser consideradas essenciais em Santa
Catarina – ‘ou seja, que não podem ser interrompidas ou suspensas mesmo que o estado
esteja passando por um período de calamidade pública, como o da pandemia de
Covid 19’. As aulas presenciais foram incluídas.” (http://agenciaal.alesc.sc.gov.br)
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Brasil, Estado de Santa Catarina, 09 março de 2021. “O secretário de Estado da Educação, Luiz Fernando Vampiro, reuniu-se na
tarde desta terça-feira, 9, com os promotores de Justiça João Luiz de Carvalho
Botega e Marcelo Brito de Araújo. O encontro, realizado na sede da Secretaria
de Estado da Educação (SED), teve como objetivo apresentar o panorama geral das
escolas estaduais e avaliar a situação das aulas presenciais.” “(...) os
seis falecimentos de professores efetivos registrados desde o início do ano
letivo, os quais a SED lamenta profundamente”. “O Ministério Público tem
exigido e reforçado que, em caso de restrições, as escolas devem ser as últimas
a fechar e as primeiras a abrir”. (https://www.sed.sc.gov.br)
Em
suma, a Secretaria de Educação (SED) e o Ministério Público (MP) do Estado de
Santa Catarina definem a continuidade das aulas presenciais a partir do decreto
do governo do Estado de Santa Catarina, onde consta que educação é serviço
essencial, mesmo num contexto de
calamidade pública.
Incoerências e inconsequências
Ao longo do ano de 2020, o governo de Santa
Catarina investiu (ou gastou?) ‘valores na casa dos milhões’ na formação de
professores e aquisição de ferramentas ou instrumentos para possibilitar aulas
remotas (online/à distância). Contraditoriamente, no momento mais grave da pandemia, onde o
Brasil amarga em torno de 2000 mortes diárias por Covid e o ambiente escolar se
prova de risco, a SED e governo de Santa Catarina pressionam gestoras/diretores
e professores para que retornem com as aulas presenciais. Para manterem seus cargos
e empregos, burocratas e profissionais da educação, por interesse particular,
político-ideológico ou por necessidade, submetem-se aos trâmites do governo
estadual e municipal, os quais apoiam declaradamente e obedecem as ações do
governo federal.
Os fins justificam os meios? (Maquiavel)
“A educação só tem sentido quando prioriza a Vida” (H.G.S.)
"A grande virtude do Céu e da Terra chama-se Vida" (I Ching, o livro das Mutações)