sexta-feira, 20 de novembro de 2020

A carne mais barata do mercado

“A carne mais barata do mercado é a carne negra”. Assim canta a mestra Elza Soares em dois dos seus magníficos discos. Música de composta e também gravada por Marcelo Yuka, Seu Jorge e Ulisses Cappelletti.

Na véspera do ‘Dia da Consciência Negra’, no Brasil mais um negro é morto de forma covarde (entre tantos outros que sofrem discriminação e violências neste país - e pelo mundo). O fato ocorreu no Carrefour de Porto Alegre, capital gaúcha. Dois seguranças, entre eles, um era policial militar, espancaram o homem de 40 anos até a morte. As informações que circulam é que o homem morreu sufocado. Teve o joelho de um dos seguranças no pescoço e provavelmente foi estrangulado (com um ‘mata-leão’, suponho). Independente do golpe ou técnica que levou o homem à morte, e das motivações para tamanha agressividade, foi assassinato. O contexto envolve dois homens ‘brancos’ (ou não negros) seguranças da empresa contratada pelo supermercado. Não é a primeira vez que crimes violentos acontecem dentro do Carrefour. Nesta mesma rede de supermercados já foi morto também covardemente um cachorro por um segurança, um vendedor que sofreu infarto e morreu, e que teve seu corpo escondido por guarda-chuvas para que o as vendas continuassem, e agora este homem negro é assassinado de forma brutal. Estes fatos revelam que esta empresa tem um histórico de violências, e que respeito pela vida, ética e moral não são o prioridades em sua ‘filosofia’. Não importa o motivo dos seguranças, eles foram muito além de suas funções (ao menos que a função de seguranças seja matar. Creio que não).

Insegurança

Em meados dos anos 90, depois de eu ter tido uma pausa com as práticas de Kung Fu, montei minha primeira banda de rock e por isso passei a frequentar eventos, boates, casas de shows e bares aqui na cidade de Chapecó. Eu ainda era menor de idade. E não foram uma nem duas, foram inúmeras vezes que tive que me defender da agressividade de seguranças e policiais. Por sorte, mediação de terceiros ou por certa habilidade e mentalidade auto-defensiva, nunca sofri maiores lesões físicas, mas sim muitas violências psicológicas, como ofensas e ameaças, com as quais tive e consegui lidar. Presenciei várias violências sobre outras pessoas por parte destes seres ‘autorizados’ (e preparados) institucionalmente para oprimir, reprimir e violentar. Manter a ordem muitas vezes foi o pretexto. Sei da necessidade de certa ‘ordem’ em espaços coletivos, porém, tudo tem limite. Mas, a questão é: o que aprendem e no que se habilitam estes seguranças e policiais? Seja nas empresas que os preparam ou nos quartéis? E porque policiais militares podem fazer ‘bico’ de seguranças por aí? Ou não podem? Qual é o motivo que leva à esta prática bastante comum? Como são trabalhadas as questões humanas e psicológicas nas ‘formações’ dos agentes de segurança? (se é que este trabalho existe). Trabalhos fundamentais, já que se trata do lidar com seres humanos ou entre seres humanos. Não sabem ainda que um golpe ou técnica como o ‘mata-leão’, por exemplo (muito comum por aí), pode matar uma pessoa em segundos? Que para o uso ‘equilibrado’ da força é preciso ter um bom conhecimento técnico e equilíbrio mental? Que para sacar uma arma se deve ter uma grande responsabilidade e também equilíbrio mental? E que antes de tudo isso, se deve estar preparado para o diálogo, para a aplicação de técnicas psicológicas que acalmem o outro e estabilizem a situação, e quando isso não for possível, outras inteligências estratégicas devem ser utilizadas, sendo que o uso da força é o último recurso, e ainda assim, limitado e controlado tecnicamente? Ou seja, um segurança, um policial ou qualquer outro agente que lide com outras pessoas precisa estar preparado ‘humanamente’ e psicologicamente para isso, além do conhecimento e das habilidades técnicas fundamentais. Caso contrário, como diz a linguagem popular, ‘dá merda!’

E o racismo?

Aliado a isso, existe, infelizmente, o fator ‘racial’. Ou seja, o racismo que é estrutural no nosso país, sendo que as maiores vítimas destas violências já citadas, são os afrodescendentes, negros ou pretos. No Brasil é senso comum dizer que é a corrupção nosso maior problema. Mas não, não é. É só mais um entre tantos. Mais que a corrupção, nosso problema é sociocultural, e ele está diretamente ligado a mentalidade de parte da população, incluindo nisso, agentes de segurança. Ou seja, é a ‘mentalidade escravocrata’ que faz com que pobres e negros sejam os mais afetados pelas violências cotidianas, sobre tudo, violências institucionalizadas, provindas de ‘autoridades’ ou indivíduos ‘uniformizados’ ou ‘fardados’, como foi em mais este caso deplorável dentro do Carrefour.

Responsabilidades

Além dos responsáveis diretos (os violentadores), as empresas responderão? Já que são elas (supermercado e empresa de segurança) que contratam e preparam tais serviços? E o Estado (polícia), qual é sua parte nisso, já que um dos envolvidos é PM? Quais são suas partes de responsabilidade nesse fato deplorável? Será que será preciso uma reação popular e/ou da comunidade negra, reação também violenta, como acontece muitas vezes nos EUA, por exemplo, onde as ruas são tomadas e empresas com casos de racismo e exploração do trabalhador são incendiadas, para que algo talvez mude? Ou continuarão não resolvendo o problema emitindo notas públicas, como é a prática comum? (percebam que tenho mais perguntas do que respostas). Nisso, encerro com a uma última pergunta coletiva, que vejo muitos fazerem por aí: ‘Até quando?’. 



terça-feira, 10 de novembro de 2020

No Abismo, a Gratidão de um mundo paralelo – mas não!

 “Aquele que luta contra monstros deve acautelar-se para não tornar-se um monstro. Quando se olha muito tempo para um abismo, o abismo também olha para você.” (F.W. Nietzsche)

O título desta reflexão crítica vem a partir daquilo que chamo de ‘teoria do abismo de Nietzsche’ (resumida na citação acima), e da forma de reconhecimento ou agradecimento que se tornou muito popular, principalmente entre praticantes ou entusiastas de um ‘modo de vida terapêutico ou alternativo’, como é muito comum de se dizer, a ‘gratidão!’. De um tempo pra cá no ocidente, a busca, aceitação e/ou assimilação de algumas filosofias, práticas de vida ou terapias orientais e nativas (indígenas), assim como, formas de se cultivar ou produzir alimentos e se (re)aproximar da natureza (meio-ambiente), se tornou algo corriqueiro. Entre estas práticas podemos citar como exemplo o yoga, a meditação, a permacultura, o cultivo e uso de plantas medicinais, a alimentação orgânica e vegana, a dança circular, o uso de ayauhasca nos céus (coletivos), o ‘xamanismo’, o tantrismo, as terapias e espiritualidades orientais, etc. Estas práticas se disseminaram principalmente entre as classes média e alta, onde pessoas se reúnem para praticar o que alguns chamam ‘estilos de vida’ e/ou aplicar projetos relacionados. E é bom que isso esteja acontecendo, principalmente se permeado pela sinceridade. Porém, uma parte desta busca ou transformação no modo de vida, que também se pensa ‘revolucionária’ em muitos aspectos e casos, acaba adquirindo uma ‘aura exclusivista’, onde se assume um discurso de superação, aprimoramento, refinamento, progresso, desenvolvimento, melhoria, superioridade de vida frente as demais.

De certo modo, dá pra se dizer, sim, que acontece uma transformação, uma superação ou aprimoramento na forma de se viver ou estar no mundo, o que também reflete numa mudança de mentalidade e comportamento. Mas o problema que trato aqui, vai além disso. Ele se refere a certo discurso que muitas vezes acaba sendo prepotente, arrogante, segregador, moralista, onde uma suposta superioridade sobre aquilo que supostamente se tenha superado, ou acima do que se tenha progredido, e aí temos a velha concepção de ‘progresso positivista’ aplicada na também suposta ‘espiritualidade’ ou mente iluminada, superior, etc., de alguns praticantes ou entusiastas destes ‘modos de vida’ que já são cult’s e não mais simples como, naturalmente e historicamente o são. O fato é que muito disso se tornou um bom negócio (grande em alguns casos), o que também pode ser dito como uma indústria, a ‘indústria do espírito’.

“O espetáculo está em toda a parte" (Guy Debord, ‘A Sociedade do Espetáculo’) 

Numa manhã, enquanto preparava meu café, ouvia uma live de uma ‘escola de permacultura’ no instagram, onde dois casais dialogavam sobre a saúde alimentar e de vida a partir das suas práticas agrícolas e terapêuticas. Um tema que muito me diz respeito, já que também faço parte deste mundo (o das buscas pela naturalidade – conceito a partir do taoismo, concepção, espiritualidade e prática de vida ao qual me integro). Lá pelas tantas falavam sobre a relação do ser humano com o meio socio-ambiental, quando veio à tona o assunto ‘mentalidade’. Nisso, o homem mais velho entre os quatro, permacultor, acabou tecendo uma relação comparativa ‘infeliz’, dizendo ter trabalhado por algum tempo em uma assentamento onde a ‘mentalidade negativa’ e a ‘vitimização’ dos assentados é que fazia com que eles estivessem naquela condição (ruim, pobre ou referente ao modo de se produzir e consumir dentro do assentamento), onde, com esta suposta ‘mentalidade de vitimizados’, eles sempre culpam o governo e o sistema pelos problemas que eram seus, provindos de suas mentes, simplesmente. Em suma, como que, se vivendo em uma realidade superior e/ou paralela, o homem ignorou totalmente a questão social e histórica (do processo histórico), afirmando que era unicamente a mentalidade o problema daquele modo de vida dos assentados. Acontece que, quem conhece assentamentos do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) sabe que a realidade não é a de pobreza ou de mediocridade (internamente falando), nem na alimentação quanto no modo de vida, já que os assentados produzem muito bem e com qualidade, respeitando o ciclo da natureza, suas manifestações e seres vivos, buscando uma produção independente e mais próxima possível da naturalidade, a partir do bom trato com as plantas, a terra, os bichos e entre si próprios. Pelo menos os assentamentos que eu conheço, assim procedem. Por isso, a fala do homem foi infeliz e reducionista. Não sei se foi intenção, discurso ideológico ou um equívoco dele com o péssimo uso deste exemplo de relacionar a questão da mentalidade atrasada do ser humano com os assentados. Noutro momento, o homem mais jovem que dizia praticar yoga e trabalhar com terapias, colocou a maconha junto da cocaína como sendo ambas ‘drogas pesadas’, num tom de superioridade (ou superação?) frente a questão, sendo que, no caso da maconha (uma erva natural, diferente da cocaína que é uma droga de manipulação químico-laboratorial), ela não é considerada ‘droga pesada’, aliás, ‘o peso não está nesta erva em si, mas sim no modo e quantia de seu uso’, bem diferente da cocaína (quem já leu ou estudou em boas fontes, ou até mesmo usou estas drogas, sabe bem a diferença entre uma coisa e outra).

"A razão diz que o indivíduo não pode lutar por aquilo que não conhece." (Hakim Bey)

A questão é que ambas as falas masculinas da live tiveram tons de ‘superioridade’, principalmente ao descartar o fator social e histórico que dá contexto para muito do que está além da mentalidade – e na mentalidade, diga-se de passagem, reduzindo-se, eles, a falarem apenas desta mentalidade como sendo o que move tudo. Mas não, não é simplesmente e unicamente a mentalidade (superestrutura) que gera as condições existenciais, mas também o fator social-material (infraestrutura). Por mais dignos e belos que possam ser seus trabalhos e cultivos, estas falas se aproximaram muito do que se ouve comumente em igrejas ou seitas que se arrogam e se colocam como lugares de ‘salvação’, conhecimentos e formas de vida superiores às demais, onde a prepotência e a arrogância são as principais características discursivas – ‘seus paraísos ou seus infernos pessoais não são os mesmos que os meus’. Na hora lembrei de um filme do diretor inglês Danny Boyle, que se chama ‘A praia’, e de certos líderes ditos religiosos, assim como de palestrantes motivadores (leia-se coaching, auto-ajuda, etc.) que criam em torno de si fiéis seguidores e reprodutores de suas palavras, intenções, estereótipos, seguidores que os edificam quase que divinamente e assim servem na manutenção de seus ‘negócios’, status e discursos.

"Todo idealismo é falsidade diante daquilo que é necessário" (F. W. Nietzsche)

Fica fácil diminuir outras realidades mais difíceis que as suas quando se fala de um lugar mais confortável (não só materialmente, mas também discursivamente), e isso é muito comum neste meio cheio de vaidades e egocentrismos, onde os discursos são sempre maiores do que a realidade. Por isso relaciono a questão com a citação de Nietzsche no início deste texto. Lutar contra monstros requer certo discernimento para que também não se torne um deles. Na série-animação ‘Avatar, a lenda de Aang’, em um dos capítulos aparece um personagem com o nome de ‘Jet’ que, na luta por mudar ou revolucionar a realidade, acaba sendo afetado por ela, a ponto de cometer erros que se somam naquilo que se diz ou pretende combater ou modificar. E é isso o que vejo em muitos casos onde estes ‘modos de vida alternativos’ que contrapõem o sistema (este caracterizado pelo modo de produção capitalista e a mentalidade que a partir dele se constitui), acabam reforçando a partir deste ‘exclusivismo’ e seu discurso de ‘lugar ideal’, acima de uma associação com a meritocracia, o próprio sistema, que todos devem saber, é elitista e segregador.

Alguns grandes pensadores ao longo da história, em suas obras falaram sobre esta relação muitas vezes discrepante entre a prática e o discurso. Lao Tsé no seu ‘Tao Te Ching’, K’ung Fu-Tsu (Confúcio) no seu ‘Analectos’, Guy Debord no seu ‘Sociedade do Espetáculo’, e mais recentemente Byung- Chul Han no seu ‘Sociedade do Cansaço’. A partir de Debord por exemplo, esses discursos e as imagens ou aparências vinculadas a eles, são elaborações típicas do que chamou de ‘sociedade do espetáculo’, esta que diariamente podemos ver nas fotos, vídeos ou discursos pelas redes sociais. A partir de Chul Han, este ‘excesso de positividade’ nos discursos, que também é a minimização ou falta de crítica e auto-crítica (como o que aconteceu nesta live), caracteriza também o que ele chama de ‘sociedade do cansaço’. Já para Lao Tsé, ‘todo o execesso é perverso’, inclusive o da ‘falsa modéstia’, assim como, ‘não se pode mais colocar chá num recipiente que já está cheio’, ou seja, quem está cheio de si próprio, que julga suas convicções as únicas, melhores ou maiores, seu modo de vida, as verdades absolutas e puras frente outras realidades menores ou impuras, já não aprende nem caminha mais,  e acaba assim se tornando parte do ‘abismo’ (leia-se Nietzsche).

Em suma, existe muita consciência e coerência dos que buscam, praticam ou vivem de forma ‘alternativa’ ao sistema, a esta cultura mecanicista que engessa o pensamento, o corpo e a própria existência – porém estes não ignoram o processo histórico. Mas também existe muita reprodução forçosa de uma realidade que é bem mais complexa do que as aparências ou estereótipos, do que os discursos, interesses pessoais e ideológicos, muitas vezes disfarçados por trás de máscaras sorridentes de generosidade, que, melhor do que ninguém, e da boca pra fora, tem a ‘gratidão’ como distanciamento, indiferença e auto convencimento... 


segunda-feira, 7 de setembro de 2020

Independência?

Nossa independência é uma história mal contada em um quadro exposto num museu.

Independência que se deu no lombo de um burro desenhado como cavalo, junto a uma dor de barriga coroada, majestosa. Nossa independência não foi popular, foi popularizada (ideologicamente). Então, ela é mesmo nossa? 

A palavra Brasil é relativa à brasa, braseiro, portanto, ao que queima e à cor vermelha, tanto que, por isso a árvore símbolo do Brasil foi chamada de pau-brasil (por causa da tintura vermelha extraída desta árvore - nossa história oficial já começou com desmatamento). Mas, os mais desavisados repetem com um orgulho ignorante e ideológico a falácia: ‘nossa bandeira jamais será vermelha!’. A frase no centro da bandeira vem da ideologia positivista e seu amarelo representa a família real portuguesa. Ou seja, nada disso é nacional ou original daqui. O Brasil é tão incoerente e contraditório como é a relação entre a sua bandeira e seu nome. Se os símbolos, as cores, as frases, não representam realmente nossa terra, nosso povo, porque não mudá-las? Símbolos também podem ser territórios, demarcações ideológicas, e neste caso, são. A insistência de manter estas representações estagnadas é fruto do conservadorismo que está além das instituições, ou seja, também está no imaginário, nos valores e crenças popularizados como imutáveis e sagrados, inculcados na mente de grande parte dos brasileiros. 

Sou cidadão brasileiro (pois nasci e cresci aqui), amante da terra, da Natureza e da vida. Também sou (ou estou) professor, artista e historiador, e não me sinto representado pelos chamados símbolos pátrios, sejam eles (e entre eles), o hino nacional e/ou a bandeira. Vivemos numa democracia, dizem. Sendo assim, porque, mesmo sabendo da história, tendo fundamento socio-histórico, portanto razão (própria e pessoal) e direito de escolha - que deve(ria) ser respeitado - mesmo assim, persistem em tentar me obrigar a fazer o que não necessito ou quero, como cantar o hino e se posicionar militarmente (posição de sentido) em frente à bandeira em todo evento oficial de Estado e no 7 de setembro? Se o regime é mesmo democrático, porque somos obrigados a votar e servir ao exército, além das formalidades já citadas acima? Isso não é incoerente? Ou são apenas os discursos que não representam a realidade, assim como é com os símbolos pátrios e a história oficializada da independência? 

Respeito às escolhas e crenças, e gostaria que as minhas também fossem respeitadas, pois o movimento deve ser recíproco. Se acham importante cantar o hino, se verticalizar frente à bandeira, tudo bem! Mas, e eu e todos os outros que não se sentem representados por isso, como ficamos? Seremos excluídos? Somos menos brasileiros por isso? Ou criminosos? Pois, somos sim, oprimidos, cobrados, julgados, pois a coerção social nos importuna (sentimos e sabemos disso), não através da força física, mais sob pena de sermos punidos de alguma forma, e esta pressão é muito violenta, quem sente sabe disso. Então, isso é democracia, liberdade ou independência? Ou é só um discurso de controle sociocultural?


quarta-feira, 19 de agosto de 2020

Educação: por uma 'cultura proativa' de resistência à violência sexual

A violência sexual contra crianças no Brasil tem números alarmantes, sendo que grande parte dos casos não são identificados ou denunciados. Dada esta triste realidade, muitas pessoas se manifestam com revolta contra os agressores nas redes sociais. Revolta compreensível, é claro. Mas, vos convido para irmos além no assunto. 

Dentro desta realidade, o que pouco se vê falar é que, além do agressor direto, existem o que chamo de os 'agentes motivadores', o que considero tão culpados quando o violentador, pois também violentam, mesmo que indiretamente, e geralmente, sem serem notados. 

Vivemos numa sociedade e/ou cultura 'sexualizada', onde se fetichiza a sexualidade como status de poder. A partir da provocação e do apelo sexual promovidos pela publicidade através das grandes mídias (programas e comerciais de TV, redes sociais, internet, outdoors, etc.), vendem-se produtos e ideologias (é óbvio que isso não justifica a atitude do agressor, nunca! Mas, pode incentivá-lo). Ou seja, sexualidade ou sexo (assim como a violência) vendem e aquecem o consumo. Isso é um fator 'cultural' que se constituiu durante anos de motivações públicas. Em suma, produtos relacionados com a sexualidade vendem, somados a certa cultura masculinizada ou machista, e estes instrumentos acabam gerando um campo fértil para a violência sexual acontecer. Nisso, além do agente direto, o violentador, devemos perceber, localizar e falar dos agentes indiretos, os 'agentes motivadores'. Por isso, além da detenção daqueles que cometem diretamente o crime, é necessário mudar a 'cultura', os valores da sociedade a partir dos meios de divulgação destes valores, priorizando não o consumismo, os estereótipos, aparências, a sexualidade como produto, assim como, as violências que são parte desta cultura, destes valores, mas sim, valores que tornem o respeito ao espaço, necessidade e realidade do outro, prioridades. A vida e a integridade física e psicológica devem ser estas prioridades, pois seres vivos não são objetos, coisas ou utilitários. Esta questão toda está ligada as relações de poder, e é disso que também precisamos falar e mudar. 

Nisso, existem espaços e instrumentos fundamentais para tal mudança de comportamento e cultural, e o principal destes instrumentos talvez seja a educação. Por isso, as instituições de ensino devem (ou deveriam), além de oferecerem aulas qualificadas de 'educação sexual', proporcionarem também aulas de 'auto-defesa' feminina (a partir de certas concepções, conceitos e professores que trabalhem bem e com sensibilidade este conhecimento) para assim se desenvolver o que chamo de uma 'cultura proativa' (antecipatória, defensiva), que possibilite a criança e mulher se defender de abusos. Também deve haver debates dentro das instituições, sobre 'machismo estrutural', gênero, direitos da criança e da mulher, para que esta triste e secular realidade (e cultura) possa ser mudada. 

Menos moralismo religioso e pedagógico, menos formalidades curriculares, assim como, pensar menos em provas, vestibulares, no ser humano como utilidade, e mais na vida, no respeito e autonomia, sobre tudo, das crianças e meninas, que são as maiores vítimas destas violências, tristemente publicizadas nesta sociedade que explora a sexualidade e vende desejos e fetiches sem responsabilidade alguma sobre a criação de seus 'monstros', pois, caráter também se constrói pelo meio social e cultural.

 


segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Adeus vó Miri...

Minha vó fazia a melhor comida de panela do mundo. Sempre no fogão a lenha. Começava cedo. Era um ritual. Primeiro pela horta. Ia juntando os temperos, transformando as coisas, criando seu sabor. Numa relação muito íntima com a natureza, majestosamente ia desenvolvendo sua arte, passo à passo. A delicadeza com que tratava suas plantas jamais será vista novamente. Nem por mim, nem por ninguém. A leveza dos passos, da presença e da voz caracterizavam minha vó. Vó Miri flutuava. Silenciosa como só ela conseguia ser. Como pluma, como passarinho. Uma mestra na arte de ser o que se é, sem estereótipos. Queria eu ter a autenticidade e leveza da minha vó. Treino muito pra isso. Talvez um dia eu consiga. Tive uma grande mestra. 

Vó Miri era irmã das plantas, filha da terra, amiga do vento. Tudo o que plantava colhia. Sua imagem, sutil como sua voz e seus passos, nunca sairá da minha cabeça. Seu sorriso tímido, porém pleno, seguirá sendo uma imagem cheia de vida. Lembro do tempo em que me deixava tratar as galinhas e de quando eu a ajudava fazer bolacha e massa. A farinha, o manivelar da máquina, a bolacha de estrelinha, nossas conversas e risos. Ah, bons tempos de criança eternizados junto da minha vó! 

Mas hoje, a vó Miri se transformou, retornou, sem alardes, assim como sempre viveu. Penso que, se todos tivessem um pouco, só um pouco do que foi a pequena, sutil e grandiosa vó Miri, o mundo seria um tanto melhor. Não tenho palavras para descrever o amor que sinto pela minha vó que acaba de partir. Penso que foi encontrar meu vô, o Chico, outro mestre, com quem viveu até seus noventa e tantos invernos, e que lhe esperava desde o ano passado. Finalmente estarão novamente juntos, como sempre foi...

Adeus minha vó querida! Boa transformação, bom retorno! 

Continua conosco em energia e memória... 

Obrigado por tudo! Te amo! Te amamos!



quarta-feira, 24 de junho de 2020

O que foi, o que está sendo e o que nos espera: uma reflexão do passado, presente e futuro

"Se eu fechar os céus, e não houver chuva; ou se ordenar aos gafanhotos que consumam a terra; ou se enviar a peste entre o meu povo; E se o meu povo, que se chama pelo meu nome, se humilhar, e orar, e buscar a minha face e se converter dos seus maus caminhos, então eu ouvirei dos céus, e perdoarei os seus pecados, e sararei a sua terra." 
(2 Crônicas 7:13,14)

Uma (entre tantas) leitura interpretativa-reflexiva pessoal deste trecho bíblico, a partir de certa relação com o conhecimento taoista:
-"Se eu fechar os céus, e não houver chuva": seca;
- "se ordenar aos gafanhotos que consumam a terra": pragas, como as atuais de gafanhotos, dengue, etc.;
- "se enviar a peste entre o meu povo": doenças e epidemias, como o atual covid-19.. * ambos fenômenos gerados (ou pelo menos agravados) pelo desequilíbrio humano-ambiental;

- "E se o meu povo, que se chama pelo meu nome": Deus como o 'todo' e/ou a própria 'Natureza', que envolve as nominações, o povo/ser humano e seu ego;
- "se humilhar" e "buscar minha face": este povo (ser humano) se reconhecer como parte do todo, da Natureza, portanto deste Deus.. ser humilde, se colocar no seu lugar (em outras palavras, 'baixar a bola');
- "orar": parar para refletir, pensar, esvaziar a mente, meditar, voltar-se para si (Deus/ser humano/Natureza = unidade), parar de correr e de tentar controlar, dominar ou exercer poder sobre as coisas.. deixar a Vida fluir, seguir o fluxo junto da Natureza de qual faz parte.. em suma, parar com seus excessos;
- "se converter dos seus maus caminhos": reverter os erros, voltar-se para as coisas fundamentais e necessárias da vida, abandonando os excessos que desequilibram a existência e agridem a vida.. se reintegrar à Natureza;
- "perdoarei os seus pecados, e sararei a sua terra.": esta é a voz, o recado da Natureza (todo, Deus, Tao), dizendo que o ser humano terá a chance de continuar vivendo a partir destas mudanças de comportamento perante ao resto da Natureza e da Vida, e assim a terra (e portanto a existência humana sobre ela) será curada.

Estava hoje mesmo dando uma aula de história sobre os povos da antiguidade, Fenícios, Persas e Hebreus.. e pré-colombianos.. e cada uma destas culturas teve seus conhecimentos, suas sabedorias e/ou reflexões.. muitos deles relacionados a crenças, mitos, religiosidade, pois não tinham todos os conhecimentos físico-científicos e filosóficos que existem hoje, então suas noções e significações passavam pela crença, fantasia e simbologia ou representação, como instrumentos de linguagem.. os Astecas por exemplo, acreditavam que os deuses haviam destruído sua civilização várias vezes, e para que isso não acontecesse novamente, faziam oferendas e sacrifícios, inclusive humanos, dedicados aos seus deuses, numa demonstração de grande desapego referente a suposta 'superioridade humana' (típica do platonismo judaico-cristão iluminista-humanista monoteísta), entregando a própria vida humana aos deuses.
A história está repleta de exemplos e fatos de ciclos de construção e destruição civilizatórias, seja pelas ações humanas (guerras e interferências humanas na Natureza), ou pela própria renovação da Natureza (Deus ou deuses).. e TODOS os impérios ou governos, TODAS as civilizações ou sistemas que um dia se desenvolveram e prevaleceram, tiveram seu tempo.. TODOS limitados, caíram, foram destruídos ou se auto-destruíram.. onde, no fim, a Natureza prevaleceu, e a Vida, independente destas estruturas culturais.. continuou.

Busquemos o fundamental Equilíbrio para que a Vida siga seu rumo natural / com naturalidade.




terça-feira, 12 de maio de 2020

Crises: viral, política, cultural, civilizatória.. e a resposta da Natureza...

Isso tudo mostra o quão vulnerável é esta ordem social, esta organização ou sistema.. e o quão é desleixado o governo e a coletividade humana, sobre tudo na questão 'econômica' e trabalhista (onde há pouca união das categorias)..
o vírus é algo natural.. acontece.. mutação da Natureza que encontra seus caminhos.. o problema é a cultura, ou seja, o modo de vida, a sociedade ou civilização, que é excessiva, vai muito além do que necessita.. explora, mal trata, esgota.. e devido as suas ações, espalha o vírus.. a Natureza já faz tempo que dá seus avisos, recados, e está novamente fazendo isso, só que desta vez, reagindo, naturalmente, se defendendo, dando, mais que aviso, respostas.. já que a dita humanidade não ouve ou percebe, é preciso mostrar de outra forma.. mas, pelo jeito ainda não percebeu..
se não mudar o modo de vida, as prioridades, o trato com a Natureza (que inclui nós humanos, além das plantas, bichos e todos os outros organismos vivos), a partir da nossa forma de se organizar e viver (é necessária uma nova forma: 'sem excessos'), a tendência é que continue assim.. e aos sobreviventes, virão outras 'respostas', outras calamidades, por culpa do desequilíbrio causado pela própria civilização, principalmente a partir das elites e seus governos..
caminhos diferentes e mais sustentáveis existem.. mas, a elite e seus reprodutores não falam disso, talvez nem pensam em mudar.. e aí está a triste e impactante realidade, sobre tudo, para o trabalhador e os mais necessitados.. num primeiro momento..
a Natureza dá seu jeito, e no fim, sempre prevalece...

Síntese de uma realidade deplorável:

Corrupção no governo federal: onde o presidente oferece cargos ao centrão em troca da sua blindagem no poder.. e o auxílio emergencial que é destinado aos mais necessitados, é pago indevidamente à militares.. corrupção no governo do Estado de SC pela compra superfaturada de respiradores.. prefeitura de Chapecó que insiste na liberação de atividades não essências fazendo da cidade recordista em casos de contaminação, tendo casos de corrupção não resolvidos (superfaturamento do corredor de Natal e das estátuas empresariais).. enquanto a floresta amazônica é devastada, povos indígenas são infectados, e o povo, o trabalhador, se contamina e morre.. tudo sob o controle de uma elite covarde.. ela e seus governos genocidas que 'normalizam' a situação..
estes são os governos que muitos elegeram.. este é o brazil atual...


"Nosso século, que tanto fala de economia, é um esbanjador: 
esbanja o mais precioso, o espírito." 

(F. Nietzsche)



terça-feira, 5 de maio de 2020

Desistências e continuidades...

Foi a dureza do mundo.. a frieza numérica desta civilização (pois para governos e outros poderes, é o que somos, números).. o que fez com que o ator Flávio Migliaccio cometesse suicídio.. num momento de crise viral e moral, a crise política se intensifica por causa destes governos, suas elites (ou vice-verso) e  seus reprodutores.. e é triste de ver e saber deste fato.. trabalhadores/as, camponeses, indígenas, moradores de rua, sendo mortos por aqueles que tem poder (e sangue) em suas mãos.. natureza sofrendo ataques da ganância humana.. num país onde a diversidade e a divisão (de terras e renda) deveriam ser a maior característica.. assim, aqui, ninguém adoeceria de fome ou por falta do que é básico para viver.. mas não, uma minoria comanda e usufrui de toda nossa riqueza, natural e cultural.. natural que deve(ria) ser para todos.. e cultural que é produzida pelos trabalhadores/as, que todos os dias cumprem seus deveres e horários (agora, com a crise epidêmica, até mais do que isso)..
Como professor e artista amador, sinto muito.. e estou mais cansado do que nunca.. não pelo isolamento social, com ele estou até aprendendo (quando há tempo).. mas, por causa dos fatos.. nunca vi tamanha bestialidade neste país.. como nunca trabalhei tanto preenchendo formalidades incoerentes por exigência de um Estado e seus burocratas que não sabem como é dar aulas, e muito menos conhecem do conteúdo que, como professor, conheço/estudo/trabalho.. alguns pedagogos burocratas inventam coisas para que cumpramos, e os governos nos despejam sem a menor responsabilidade e coerência, a maioria delas sem sentido, principalmente para o momento.. para a educação, para a vida.. mas ela, a vida, é o que menos importa para estes, preocupados em controlar e ter números somados depois nas suas estatísticas e contabilizações estúpidas, quando o que importa(ria) seria a saúde mental, física, existencial do ser humano.. o que se aprende, nós, professores ou mestres, e a vida ensinam.. as formalidades são distrações e excessos.. excessos estes, os que, justamente, estão empurrando a civilização para o abismo.. mas muitos fecham os olhos pra isso.. a sabedoria ancestral nativa (indígena e taoista) nos mostra faz tempo os caminhos.. e a Natureza vem, faz tempo também, nos alertando destes excessos.. mas, cegos e surdos, viciados neste modo de vida decadente, um sistema que tem donos: os poderosos (grande empresários, latifundiários, alguns religiosos e seus governos), e que serve pra poucos, insistimos em manter.. em nome dos seus monopólios, acúmulos e excessos, adoecemos e muitos de nós morremos (e morreremos)..
Sinto muito pelo que esta acontecendo, a exemplo deste grande ator (de do grande compositor e cantor Aldir Blanc, que morreu de Covid 19 por não ter condições de pagar um tratamento adequado - um grande artista abandonado pelo seu governo/país, e nenhuma nota da secretária de Cultura deste governo) que se cansou e desistiu desta cultura ou civilização.. mas, busco força/energia na Natureza, nas artes e nos seres sensíveis, para que possa(mos) seguir lutando.. buscando as mudanças necessárias para melhorar este mundo que, só livre dos excessos, poderá ter o equilíbrio fundamental para sua continuidade... 



sexta-feira, 27 de março de 2020

Vícios, virtudes e a epidemia: questões que talvez você não queira admitir


Algum filósofo, o qual não lembro quem, anotou que na cultura humana há uma divisão que a distingue e a caracteriza em dois grupos: 1. o da virtude; 2. o do vício.  Nisso, estive pensando sobre a prevalência do grupo 1 sobre o grupo 2. Ou seja, existe muito mais viciado do que virtuoso nesta sociedade, cultura ou mundo. E isso explica boa parte da atitude das pessoas que, na primeira motivação governamental-empresarial, em plena crise viral onde o risco de contaminação é iminente, retornam correndo para seus trabalhos. Essas pessoas são doentes, pois são viciadas. Sim, drogadas, fissuradas, adestradas, viciadas ao servilismo. Aprenderam assim e se veem loucas quando necessitam parar por alguns dias. Outro fator agravante para tal atitude irracional é a ansiedade, característica típica do nosso modo de vida que concorre e disputa mais do relaxa e descansa, motivada pelo comércio e sua publicidade excessiva. Isso, somado, é claro, a ambição ou ganância. O medo também é outro fator. Porém, medo, eu também sinto, todos sentem. Então talvez seja o menor dos fatores.

Mas, o fator principal aliado ao vício, é que boa parte destes pais e mães de família não suportam a própria vida que levam. Ou seja, não aguentam suas condições existenciais e recorrem para as ilusões, alienações, ocupações servis. O sistema é seu grande deus, que os abraça, e como Zeus no Olimpo, joga com suas vidas. E eles aceitam o risco, pois suas realidades cotidianas são tão insuportáveis como casal, pais, consumidores, cidadãos, homos sapiens que não necessariamente sabem que sabem, que acabam optando pelo risco da doença e até da morte do que pela calmaria e pela vida familiar. Ter que passar o dia e noite toda junto da esposa e dos filhos, bichos de estimação, paredes do apartamento, é uma tortura para tais e quais (isso também serve para muitas esposas referente aos seus maridos). Por isso é que a família em grande parte dos casos é uma fachada, um discurso, uma mentira. O ‘estereótipo da família feliz - e pequeno burguesa’, a também chamada ‘família de bem’. E estas pessoas tem o poder de se auto-enganar, de se auto-mentir. Este tipo de viciado é irracional e age por ondas de emoção suscitadas por alguém ou algo que os quer dominar ou domina, e pela publicidade e/ou ideologias de controle.

E agora estamos todos nós presos a este risco, devido a hipocrisia e a estes viciados que sempre fugiram dos tratamentos (sim, existem a Arte e outras filosofias ou modos de vida que curam). Continuar nas suas vidas medíocres de auto-engano e de aparências prepotentes ou vaidosas, escravos de certas crenças e práticas (sendo o trabalho da forma que é, uma delas), é o que, no fim, acaba botando em risco suas próprias vidas, e pior, a dos outros também. Se ficassem em casa (muitos do que estão saindo poderiam), e neste momento de ‘isolamento social’ buscassem mudar, melhorar, crescer internamente e mentalmente, desenvolvendo novas possibilidades e conhecimentos, novas percepções, ou seja, tratando seus vícios rumo a se tornar pessoas mais virtuosas, depois da crise epidêmica (que vai passar – infelizmente não para todos/as), poderiam ser agentes de uma nova cultura, de uma nova sociedade ou civilização, mais digna, sensível, equilibrada. Mas, falta-lhes coragem para isso (e talvez sanidade). Enfim... Aos viciados sobreviventes, que se tratem e se curem, aos virtuosos, minha admiração e respeito, seguimos juntos, mesmo distantes...



Resistir para existir em tempos de febre aftosa...

Bastou um pronunciamento presidencial tosco, e o governo estadual ceder a pressão do grande empresariado anunciando 'flexibilidades' que, em pavoroso, o povo sem equilíbrio toma as ruas. Alguns, reproduzindo o 'presidente' dizem: 'O vírus só derruba idosos'. Idosos estes que construíram o país e sua economia (esta mesma que desfrutamos até hoje), que nos criaram, deram carinho, vida. E agora, é assim que retribuímos? Gado! O gado corre pra outro confinamento, o de antes. Logo, logo, muitos vão pro abatedouro. Mas é que são gado, e gado só segue, obedece, sem sentir ou pensar. Mais uma vez o discurso retórico (e tosco) da 'salvação da economia' puxa pela canga o gado que, prepotente sai pra rua botar em risco a vida, e não só a sua (o gado também é egoísta). Economia! Qual economia? Pra quem? A elite minoritária se esforça para salvar sua economia, seu sistema monopolista e exploratório, seu modo de vida que não se sustenta e vive sobre corpos, mentes e almas, usando mais uma vez o gado (e a vida) para seus fins privativos - este seria o momento oportuno para uma transformação social, uma revolução que alterasse para melhor o modo de vida e a sociedade (se não houvesse tanto gado, é claro!). A intensificação das infecções e mortes vai pra conta, pro currículo, pro histórico do 'presidente', do governador, do grande empresariado que força esta situação, da 'justiça', do Congresso (e do gado). Torço, sinceramente, para que o pior não aconteça - e ajo: ficarei em casa até quando puder, na desobediência, na rebeldia e resistência, pelos meus, pelos pais, avós e crianças, pois não sou gado! 



terça-feira, 24 de março de 2020

A mudança urgente e fundamental

Passada a epidemia.. será que o Brasil e o mundo seguirão no ritmo de antes? se seguir, não levará muito tempo para uma outra catástrofe (talvez ainda pior) acontecer.. esta civilização, esta cultura, este 'modo de vida' já não mais se sustenta.. se é que um dia se sustentou.. nisso, seria a hora, o momento de os governantes tomarem peito e chamarem intelectuais da filosofia, sociologia, ciência, administração, artistas, grandes estrategistas - e o conhecimento ancestral e popular - para pensarem e elaborarem um novo projeto de sociedade, de civilização, a partir da real sustentabilidade e equilíbrio social e ambiental.. (obs.: sei que no Brasil o atual presidente ou governo não tem cacife nem cabeça pra isso, infelizmente!)..
No Brasil é urgente diminuir, por exemplo, a carga horária de trabalho, de 8 para 6 ou 5 horas.. dividir isso por turnos.. investir em transporte público de qualidade, trens, ciclovias, limitando a circulação de automóveis particulares.. fazer uma Reforma Agrária, política, educacional com ênfase no ser humano e na Natureza.. estipular limites de ganho/lucros.. taxar/dividir riquezas e heranças acumuladas e investir mais, muito mais, em saúde (estrutura, profissionais, acessos) e educação (arte, cultura, ciência).. é necessário 'radicalizar' neste sentido, para que a cultura humana siga com menos interferência prejudicial a Natureza, e a si próprio.. este é (ou seria) um momento importante para pensar novas possibilidades.. mas, até então, não estou vendo estas iniciativas..
Penso que, sem esta mudança sociocultural (que envolve economia e política), que é uma mudança mental e comportamental, limitando o acúmulo de riquezas e de poder, assim como, garantindo uma maior divisão de renda e acesso ao conhecimento/educação/cultura, saúde e transporte/mobilidade (públicos de qualidade), não melhoraremos nossa situação/condição humana e sociocultural no planeta.. pois, como prenuncia uma antiga sabedoria: "TODO EXCESSO É PERVERSO" (Tao Te Ching, Lao Tse).. isso não é pessimismo, apenas um olhar pelo binóculo da história e pelas lentes da filosofia (e do conhecimento ancestral / popular).. não é preciso ser estudado, intelectualizado ou um gênio para ver isso tudo.. é só parar um instante para pensar, refletir e perceber..
Em suma, se não desacelerarmos, provavelmente sofreremos acidentes e quedas ainda mais bruscos.. e assim, o risco de perdermos a única coisa que realmente temos (e que nos tem), será iminente: a Vida...












Portanto, a questão é: 'EQUILÍBRIO!' ☯️🌳

sábado, 21 de março de 2020

O vírus e a disciplina


* Obs.: o título desta reflexão também poderia ser ‘o vírus e a educação’, ‘o vírus e a cultura’, ‘o vírus e o conhecimento’ ou ‘o vírus e a sabedoria’.

O covid-19 ou conrona vírus saiu da Ásia, mas precisamente da China, mais precisamente ainda da cidade de Wuhan, província de Hubei na região central do país (e que fica aproximadamente 4h30min de carro até Wudang, onde estão localizadas as montanhas que abrigam templos taoistas, talvez o maior reduto do taoismo na China, e a credito, no planeta), e se espalhou pelo mundo - e neste exato momento em que escrevo, segue a se proliferar. Todos devem saber, a China é o país mais populoso do mundo, mas também, um dos mais organizados e disciplinados em sua educação e/ou cultura. Filosofias, espiritualidades ou modos de vida milenares conferem ao país tal condição. Países próximos também herdaram deste ‘tigre asiático’ esta cultura que envolve muita espiritualidade, diversidade e disciplina. E além do conhecimento técnico, científico e tecnológico que a China possui hoje, foi desta disciplina, provinda da sua milenar tradição cultural, que a China conseguiu ‘controlar’ a disseminação interna do vírus que neste instante assola a humanidade. Ou seja, o povo cumpriu o protocolo de prevenção e combate ao vírus, ficando em casa.

“O que não se regenera, se degenera”. (Edgar Morin)

Os menos sensíveis – ou mais grosseiros (como foi o caso de um dos filhos do ‘presidente’, o deputado Flávio Bolsonaro), dirão, a partir de um reducionismo simplista que ‘a culpa pela crise é da China’, outros que ‘o governo ditador e comunista chinês fabricou e espalhou este vírus para derrubar o capitalismo, os EUA e os países livres’. Mais abaixo (ainda?!) destes, tem aqueles que, incrivelmente dizem que ‘o vírus foi um plano da China comunista para destruir Bolsonaro’, decerto, dada a ‘importância’ do ‘nosso presidente’ na ordem do dia e do mundo. Tudo o que não precisaríamos agora é uma crise diplomática com a China, deflagrada pelo ‘filhinho do papai’ e seus vômitos inconsequentes. Assim como o pai, cada vez que fala ou age cria riscos. Ou seja, este governo em forma de ‘clã’ (família Bolsonaro) é um perigo e coloca muita coisa em risco, atua praticando crimes de responsabilidade (entre outros), e incrivelmente ainda está no governo do país, como? Perguntemos isso ao Dr. Sergio Moro, ministro da justiça, alguns empresários, ao STF, aos deputados e senadores, acredito que tenham a resposta.

"Tudo está ligado, como o sangue que une uma família. Todas as coisas estão ligadas. O que acontece a Terra recai sobre os filhos da Terra. Não foi o homem que teceu a trama da vida. Ele é só um fio dentro dela. Tudo o que ele fizer à teia estará fazendo a si mesmo." (chefe Seattle, 1856)

O taoismo é uma das principais bases (talvez a principal) do conhecimento milenar chinês, que envolve a experiência, o estudo e a espiritualidade (que envolve cultivo de energia e práticas meditativas), sendo uma ‘filosofia espiritual de conhecimento prático’ que possui uma ‘medicina’ própria e ancestral, herança dos nativos, organizada por estudiosos, antigos mestres e mestras deste conhecimento, desta sabedoria.

E qual é a relação do taoismo enquanto conhecimento e/ou cultura com a situação envolvendo a pandemia viral? Sendo o taoismo a base da MTC (Medicina Tradicional Chinesa), ele, enquanto conhecimento, fornece os princípios fundamentais para várias prevenções e tratamentos. Em Wuhan, a MTC somou-se a medicina moderna ocidental no tratamento dos casos de contaminação pelo vírus, o que resultou num trabalho bem sucedido. Enquanto os pacientes infectados eram tratados quimicamente pela medicina de cunho ocidental, também eram pela medicina tradicional chinesa. Como prevenção e parte de tratamentos, foram aplicados os princípios e conhecimentos taoistas do Chi Kung, do Tai Chi, assim como a acupuntura, a moxaterapia, a meditação, o uso de ervas em chás, a alimentação equilibrada, etc. Junto a isso, algo fundamental, a disciplina. Sim, o isolamento social requer de muita disciplina, e para que o vírus fosse contido, esta postura foi fundamental.

“Através da retidão organiza-se o reino” (Tao Te Ching, Lao Tse)

Então, a fórmula foi de certo modo ‘simples’ ou prática: de uma forma geral, tratamento e prevenção somando os conhecimentos (oriental e ocidental), com boa disposição e organização dos espaços e cuidados necessários aos infectados, e aos não infectados, o bom uso das tecnologias e a disciplina de parte significativa da população, em auto-isolar-se e na autoprevenção, a partir dos princípios e práticas cotidianas de origem tradicional e/ou taoistas. Em suma foi esta disciplina, a que, infelizmente não possuímos, que fez (faz e fará) a diferença no controle e/ou contenção do vírus. Por isso, todo respeito ao conhecimento daquele povo. Aliás, à todo o conhecimento que seja humanizado e que respeite a naturalidade e a Natureza. Mas, como a realidade não é feita de ‘seria’, tratemos de lidar com a nossa condição, como a nossa realidade, mas, por favor, utilizando a inteligência. Nisso, não copiar o que dá errado, mas sim o que dá certo, já é um grande avanço. Então, copiemos o exemplo de alguns países e Estados asiáticos como Taiwan, Singapura, Coréia e a própria China, ao invés de reproduzirmos preconceitos estúpidos contra estes povos e suas culturas. Precisamos de melhor educação e uma transformação sociocultural (que envolve a política e também a economia). Educação esta que pode(ria) nos conceder a disciplina necessária para lidarmos com situações calamitosas como a atual. Por isso VAMOS PARAR! FIQUEMOS EM CASA já!

"Que o homem é a mais nobre das criaturas pode ser inferido do fato de que nenhuma outra jamais contestou essa pretensão." (G. C. Lichtenberg)

Certamente, se tivéssemos menos prepotência, arrogância e falatórios, mais serenidade e busca por equilíbrio – ou seja, mais disciplina ao modo taoista, por exemplo, controlaríamos (e nos controlaríamos) bem melhor a propagação deste vírus, no mínimo. Equilibrar a si próprios é também somar no equilíbrio da vida, pois ela é isso, um grande espírito que envolve todos nós, e entre pessoas e vírus, da maior à menor forma de vida, todos, incondicionalmente, fazem parte da Natureza que, quando desequilibrada, trata de equilibrar-se para que a vida continue, e neste reequilíbrio, às vezes, alguns seres são descartados. Por isso precisamos viver com a Natureza e não contra ela, e compreendermos que nós, seres humanos, não somos a forma mais evoluída ou melhor de vida, mas sim, mais uma, com tanto valor quanto as outras - perante a grande-mãe, a Natureza. Pensar na nossa pretensa superioridade, é uma crença, e não passa disso, pois, como em outras palavras está escrito na principal obra taoista, o Tao Te Ching, ‘a Natureza, perante a Vida, não distingue os seres, tratando-os todos, como cachorros de palha’.

"Céu e terra não têm atributos e não estabelecem diferenças: tratam as miríades de criaturas como cachorros de palha." (Tao Te Ching, Lao-Tse)

Que possamos aprender com este momento difícil, saindo dele ‘fortalecidos, transformando a tragédia em potência’ (como diria Nietzsche), e aprendendo sobre tudo que, ‘todo o excesso é perverso’ (verso do Tao Te Ching), e que a Natureza e a Vida buscam equilíbrio não metas ou objetivos finais. Por isso, vamos parar de correr e gritar em demasia. Aprendamos a caminhar, com passos leves, com o vento, e ao invés de gritar, falar ou sussurrar. A Natureza, grande-mãe e mestra nos oferece Caminhos, para caminharmos com calma e relaxamento. A angústia e a dor são resultados dos nossos passos, de outro lado, a alegria e a plenitude também. Passada a tempestade, que venha a calmaria e o aprendizado, que nos forneça mais sabedoria para não errarmos tanto.

"A grande virtude do Céu e da Terra chama-se vida" (I Ching, o Livro das Mutações)

Cultivemos a energia/imunidade e fiquemos em casa, agora!



sábado, 7 de março de 2020

‘O sangrado Feminino’ na cultura patriarcal - e a 'auto-defesa' proativa



8 de Março se celebra e se manifesta  o ‘Dia Internacional da Mulher’ pelo mundo. As origens históricas desta data nem sempre ou quase nunca são consideradas, pois geram debate e reflexão, quando não vergonha. Sim, vergonha humanitária. Quando lá, em meados do século XX, numa fábrica têxtil de Nova York, nos EUA, mais de uma centena de operárias morreram carbonizadas num incêndio intencional por lutarem por melhores condições de trabalho e respeito ao seu gênero. Outros fatos, sob tudo relacionados a lutas femininas por direitos e respeito, também marcam esta data. Fatos estes que levaram a ONU (Organização das Nações Unidas) oficializar o 8 de Março como Dia Internacional da Mulher. E aqui estamos nós, manifestando, comemorando, alegres ou enlutados.

Muito sangue feminino correu para que as mulheres conquistassem seus direitos. Sangue este que, contudo, parece ainda não ter sido suficiente para que as mulheres sejam devidamente consideradas, valorizadas, respeitadas. No Brasil, um dado recente diz que, a cada 7 horas uma mulher é assassinada por um homem. Outro que, a cada 4 horas uma criança feminina (menina) é estuprada por algum homem da família ou próximo dela. Estas são, mais que estatísticas, fatos que o Brasil amarga. Além deste quadro já ser horrendo, diariamente vemos manifestações do machismo (que é cultural ou estrutural, portanto histórico) pelas ruas, dentro das instituições e famílias. Ele também está na publicidade e no discurso e atitudes de homens (e algumas mulheres, infelizmente) públicos. Por exemplo: “Não te estupro porque você não merece” e “Mulher tem que ganhar menos porque engravida”, são algumas das palavras machistas, ofensivas e violentas publicamente desferidas pelo presidente da república Jair Messias Bolsonaro. Sendo um homem público, ‘líder’ de uma nação, eleito pelo voto popular, Bolsonaro, ocupando o cargo que ocupa, é um ‘agente motivador’. Ou seja, suas palavras repercutem, dão eco, influenciam, fomentam, inspiram ou motivam todos àqueles que, como ele, violentam de alguma forma o gênero feminino. E muitas vezes esta violência sai do âmbito verbal, simbólico e/ou psicológico e vai ao âmbito físico, ou seja, resulta na violência física-corporal, que pode ir desde a agressão física, lesionando o corpo (e, portanto a ‘alma’, afetando o psicológico), até a morte. E aí estão os inúmeros e diários casos de feminicídio para comprovar isso.

Uma das nossas grandes questões referentes à violência (seja ela física ou psicológica) decorre da cultura, ou seja, do modo de vida, suas crenças e concepções, que vão, de uma forma ou de outra, chegar à prática cotidiana. O machismo e o grande capital acumulado (capitalismo), que é ancorado no patriarcado, aliados, promovem em larga escala (e executam) a cultura da violência contra a mulher.

Por uma ‘cultura proativa’ (valorizando a Vida)

Nossa cultura não é preventiva nem antecipatória. Ou seja, a proatividade não está no nosso calendário humanístico, somente no comercial. Ser proativo é ser preventivo ou auto-defensivo, o que resulta numa autonomia de ser e estar, mantendo certa integridade e espaço existencial próprio. Nisso, como estudante e professor de um sistema dito ‘marcial’ de Kung Fu, chamado de Wing Tjun, que envolve também a prática do Chi Kung e do Tai Chi Chuan, além das concepções filosóficas e espirituais taoistas (leia-se espiritualidade aqui como algo diferente do que se tem no ocidente, e taoismo enquanto filosofia, espiritualidade e cultura ou prática de vida), pratico este que é um grande conhecimento, uma  grande arte, a modo de manter-me proativo, pois antecipar, prevenir, como bem diz o ditado popular, é o melhor remédio. E, por experiência e tendo como referência meus estudos nesta área, penso que toda mulher e criança deveriam estudar/praticar algo em ‘auto-defesa’. Algum estilo ‘marcial’ que seja proativo, ou seja, que possibilite a prevenção, antecipação e auto-defesa, tanto do corpo quanto da mente. Infelizmente, na grande maioria dos casos, não há tempo para acionar os meios legais de combate a violência contra a mulher, contando que, as situações não são programadas para acontecerem, e nossa cultura exclui o ‘caos’ da sua visão e sensibilidade. No caso, não somos preparados culturalmente para atuar de forma proativa, por isso estamos à mercê das circunstâncias, sob tudo a mulher e a criança, por estarem inseridas numa cultura machista e violenta, predominantemente patriarcal, onde a violência e autoritarismo são fortes características.  

A partir deste contexto, através da AFWK (Associação Fluir Wing Tjun Kung Fu), já fiz projeto e ofertei publicamente meus trabalhos na área, na intenção de integrar através da prática, o combate à cultura da violência contra a mulher. Porém e infelizmente, tivemos pouca aderência, resultado também de certa cultura ou da falta de uma cultura proativa (preventiva e auto-defensiva) nas concepções e práticas diárias femininas.

Sei da importância da reunião das mulheres em torno deste tema, das suas organizações, mobilizações, das suas práticas integracionais que fazem avançar a questão e amenizar o problema, porém, junto a isso, penso que seja necessário, além do debate e da denúncia, ter o mínimo de noção e estudo de técnicas que possibilitem a ‘auto-defesa’ (marcial e sensorial), seja ela coletiva ou pessoal, além da teoria (que é fundamental) - em suma, NA PRÁTICA. Esta é a questão. Uma questão URGENTE, pois alguns ou muitos homens, o patriarcado (e/ou seu machismo que é cultural, portanto estrutural), ESTÃO MATANDO AGORA, com ou sem mobilizações e debates relativos ao tema. Não há tempo e não dá para esperar, pois a mudança, havendo, será a longo prazo - e a vida é agora - devido, justamente, ao modo de vida (cultura), que todos devem saber, envolve a tradição (crenças, costumes e concepções que geram a prática cotidiana).

Em suma, não quero com este texto dizer ou ensinar como se deve pensar ou agir, mas talvez poder contribuir com a percepção, que passa pela reflexão e deve, impreterivelmente, ir de encontro à prática. Portanto, isso é um convite à proatividade, uma cultura que pode mudar a história pessoal e coletiva, gerando novas possibilidades de Vida.

"A grande virtude do Céu e da Terra chama-se vida" (I Ching, o Livro das Mutações)




domingo, 19 de janeiro de 2020

Pepe e sua prática de vida.. para além do discurso 'revolucionário'...

O socialismo que não é
os que se dizem de esquerda.. os que se dizem socialistas, comunistas, libertários.. realmente o são se viverem conforme a necessidade.. na simplicidade (que não significa pobreza).. o excesso corrompe, concentra, causa danos aos outros e a si próprio.. é coisa da burguesia capitalista, herança das dinastias imperiais.. coisa das elites que usam o poder para controlar, dominar, destruir (mesmo inconscientemente).. a república não pode reproduzir características da monarquia (tapetes vermelhos, pomposidades, esbanjamentos, excessos).. então, em muitos casos, trata-se de desapegar e não acumular.. muitas vezes a segurança é um discurso.. socialismo é vida coletiva, não privativa..
o doc 'El Pepe, una vida suprema' do mestre Emir Kusturica ('Underground', 'Gato Preto Gato Branco'), disponível na Netflix, traz outro mestre, Pepe Mujica e sua vida, que é exemplo de coerência com aquilo que acredita, se diz e luta.. para além do discurso, a prática cotidiana.. sem isso, não há 'verdade', não há transformação..
A 'revolução' é cultural
Mujica, 'é um mestre taoista, mesmo não sendo', pois vive em conformidade com a necessidade, com a naturalidade.. a Natureza também é a sua grande mestra.. busca 'equilíbrio'..
pude ver o documentário do Kusturica sobre Pepe, e vos indico.. sem o que ele levanta, principalmente em termos de cultura (modo de vida), não há transformação social, apenas continuação disso que está aí.. pois, só melhoria econômica material, é muito pouco para a questão humana, social e ambiental.. a questão está, sob tudo, na 'cultura' (modo de vida, prática, pensamento).. e eu insisto faz muito tempo nisso..
enfim.. boas leituras - e novas práticas (se realmente querem transformar) - o trailer: