terça-feira, 3 de maio de 2016

O crime de Dilma (ou O ‘Tchau querida!’ e o machismo)


A caçada a presidenta Dilma, além de um processo cheio de subjetividades que pouco ou nada comprovam algum crime por parte dela, começou já na sua primeira campanha eleitoral. Um dos principais motivos: ser mulher! Sim, um ser humano do gênero feminino. Bem lembro de algumas polêmicas geradas e alimentadas por sua oposição e pela grande mídia nacional (que também faz parte desta ‘oposição’), não só político-partidária, mas oposição de gênero e condição sociocultural. Ou seja, a primeira presidente (ou presidenta) mulher, eleita democraticamente pelo voto direto, desde o início gerou resistência de alguns muitos setores conservadores e machistas da sociedade, acostumados, historicamente com o jogo de poder entre varões (leia-se homens ou machos). Historicamente o Brasil é um país (como tantos) patriarcal, onde a mulher sempre foi inferiorizada, e a perseguição à presidenta iniciada pelo preconceito, antes mesmo de se tornar presidenta, onde chacotas com seu biotipo, sua aparência, sua oratória e sua história de mulher guerrilheira contra a ditadura militar (regime que, diga-se de passagem, também foi masculino e machista), reforçada depois de já ser eleita, representa em certo grau esta tentativa continuada de inferiorização, submissão e ‘marginalização’ do feminino – também na política. E está aí a medíocre e machista frase dita pela boca de muitos deputados (homens – ou algo similar a isso) no dia da votação do impeachment no congresso: ‘Tchau querida!’. Uma forma ‘irônica’ ou ‘sarcástica’ de impor o predomínio do discurso e postura machista, de forma ‘semi-velada’ (tentando ser ‘engraçadinha’) sobre a imagem, corpo e pessoa de Dilma, que, mais que uma chefa de Estado, é uma mulher. Não bastasse isso, a grande mídia ideológica e imbecilizadora, usou outro chavão do gênero, só que agora acima da figura da possível futura ‘primeira dama’, tentando gerar um efeito contrário, que diz: ‘bela, recatada e do lar’. Esta configuração representa aquilo que a sociedade patriarcal-machista quer que seja ou continue sendo a mulher brasileira. Ou seja, que a mulher tenha estas características e funções na sociedade. Substituindo a falta de ‘presença’ ou ‘aparência forte humana’ do vice Michel Temer, sua esposa, mais nova e seguindo um estereotipo de ‘mulher’ que muitos querem que seja, acaba servindo à ‘ideologia do território’ como um símbolo de demarcação deste espaço que é o poder, mesmo ela sendo apenas ‘alguém ao lado’ do seu ‘homem’. E é isso que os machistas que ocupam parte significativa do poder governamental querem. Dilma não é esta mulher, ‘símbolo sexual’ de uma suposta ‘fragilidade’ ou ‘feminilidade’, onde a beleza estética segue certo padrão que, por sua vez, vem acompanhado de certo comportamento. Comportamento este inferiorizado na figura feminina. Dilma, diferente de grande parte dos seus desafetos políticos (homens) não faz happy hour nos bares de Brasília no final do expediente, nem tampouco os acompanha nos vídeos pornôs ou noitadas nas zonas do entorno da capital federal. Dilma é mulher de carne, osso, alma, cabeça e coração, e não uma manequim ou alegoria dos homens que a perseguem e incriminam. Por isso, o ‘crime’ de Dilma está além de ser presidenta petista. O ‘crime’ de Dilma para estes senhores hipócritas e machistas, é ser mulher. Eis um dos principais motivos desta caçada em forma de golpe e enfeitada com o título de impeachment.


* também publicado no jornal Gazeta de Chapecó



Nenhum comentário: