segunda-feira, 7 de maio de 2012

Análise sócio-histórica do contexto sócio-político mundial – ontem e hoje

...ou, simplesmente um blefe delirante de linguagem para além do racionalismo cientificista de ordem utilitarista cartesiana, e da moral judaico-cristã




O mundo da tradição política institucional-oficial ainda respira. Mas muito do que era pulmão agora é bolsa de ar. Ofegante, mas respira. Nos EUA, Obama, o primeiro presidente negro (ou afrodescendente) do país, com suaves passos na religião e cultura muçulmana, entra de corpo e alma no liberalismo contemporâneo. No Brasil, guardadas as devidas proporções, acontece algo semelhante. Dilma, a primeira ‘presidenta’ (ou presidente) mulher da história, também caminha com suaves passos, mas só que, ao invés da relação com a cultura muçulmana, aqui é com as concepções atuais da esquerda marxista. Enquanto isso, a China dita ‘comunista’, resplandece aos olhos do mundo globalizado com seu Estado ‘socialista-capitalista-imperial’ forte. Um misto de economia planificada social, exorbitantes lucros com ascensão econômica e tradições milenares enraizadas (culturalmente falando). Na Grécia, cadeiras do parlamento divididas entre ‘socialistas’, ‘sociais democratas’ (nova democracia – com maquiagem e perfume novo) e, surpresa! Os conservadores de extrema direita: ‘neonazistas’. Agora é a luta para um governo de coalizão (ou colisão? – devido as divergências ideológicas, seguindo uma lógica – que nem sempre existe e/ou funciona - ta mais pra isso!). Já na Europa, a França acaba de passar por uma eleição que derruba Nicolas Sarkozy, representante da Social Democracia ‘a la francesa’, que acaba substituído no poder por François Hollande, do partido socialista. Um novo desenho para um ‘novo mundo’. Quer dizer, não tão novo...



“No edifício do pensamento não encontrei nenhuma categoria na qual pousar a cabeça. Em contrapartida, que belo travesseiro é o Caos!” (Emil Cioran)

A velha Grécia que nos deixou de herança a filosofia (além do culto ao corpo), principalmente com o ‘triunvirato’ da antiguidade clássica: Sócrates, Platão e Aristóteles (praticamente um suposto trio de mafiosos da razão – ou suposta razão), e que ‘inventou’ a política e o modo de pensar nos moldes ocidentais que a gente conhece, e de certo modo, ainda segue até hoje - já não sabe encontrar o caminho para sua ‘salvação’, principalmente econômica (até a velha nação desses três ‘grandes pensadores’ rendeu-se ao capitalismo liberal e a social democracia ‘a la francesa’ - e a contradição disso tudo preconizada pelo velho comunista Karl Marx). Nisso tudo, historicamente falando, podemos organizar cronologicamente uma sucessão de fatos que nos trouxeram até os dias atuais, com todos os vícios, crenças, ideais, medos, modos e práticas muito presentes e que se mantém em vida ativa hoje, aqui e agora. Começamos pelo ‘banimento’ ou tentativa disso (pode ser também, maldição) da filosofia pré-socrática. Na Idade Média, também chamada ‘Idade das Trevas’, onde o conhecimento humano (filosófico-científico-racional) era ‘proibido’ (entre muitas outras proibições), restaram apenas algumas fagulhas literárias e filosóficas da antiguidade, geralmente contidas (porém, utilizadas) pela Igreja e pelo ‘poder real’. Depois absorvidas pelos filósofos da Igreja, Santo Agostinho e São Tomás de Aquino (leia-se Escolástica), e transformadas em direção e/ou apontamentos cristãos. Para o filólogo-filósofo alemão Friedrich Nietzsche, Platão é um exemplo de pensador ‘pré-cristão’: “(...) o conceito de ‘bom’ já é seu conceito supremo -, que gostaria de aplicar a todo o fenômeno Platão, antes de qualquer outra, a dura expressão ‘patranha superior’ – ou, caso preferirem, idealismo”. Mas foi com a Reforma Protestante de Martinho Lutero que as coisas começaram a se encontrar. Ou seja, podemos traçar um perfil, espécie de linha do tempo, apontando os caminhos para se chegar mais precisamente aos dias atuais, no que diz respeito aos pensamentos, crenças, ideologias, valores e moral. Depois da expansão das novas idéias cristãs (leia-se protestantes), frente ao conservadorismo tirano do catolicismo medieval, já com a burguesia liberada da sua ‘pena eterna’, podendo atuar de forma mais livre nos rumos da sociedade e cultura, inclusive da política e principalmente economia, com a decadência do feudalismo e todo aquele contexto ‘sagrado’ do período medieval, é que vem o Renascimento em busca dos valores greco-romanos deixados para trás, lá na antiguidade clássica, inclusive o pensamento, ou seja, a filosofia. Um desses valores é o Humanismo que, além de ser corrente na Grécia antiga, também foi profetizado por ícones religiosos como o próprio Cristo – cada qual com sua peculiaridade, mas ambos tendo no homem, no ser humano, um motivo para a mudança de cenário. Com as Cruzadas e o claro interesse católico-cristão de tomar a cidade sagrada de Jerusalém, disseminar a fé católica e impedir o avanço do protestantismo pelo mundo, os cristãos puderam entrar em contato com a cultura muçulmana, e através dela, abrir-se mais para a ciência e o pensamento filosófico. Foi com os muçulmanos que os cristãos tiveram acesso a filosofia grega. Nisso, a alta burguesia, a maçonaria e os cavaleiros medievais, passaram a ter forte influência dessa filosofia. Então veio a Contra-Reforma católica e a fusão desses elementos e contextos, deu a luz às trevas. A Idade Média, definitivamente estaria encerrada. Mas, muito do pensamento, crenças e algumas práticas medievais, persistem ainda hoje.



“A quem lhes despedaça as tábuas de valores, ao infrator, ao destruidor. É este, porém, o criador”. (Assim falou Zaratustra – Nietzsche)

O racionalista René Descartes com seu ‘Penso, logo existo’, estabeleceu algumas regras para o seu método cartesiano (a comprovação científica toma definitivamente o lugar de ‘deus’ nas descobertas e estudos humanos – mas não totalmente). O terreno estava pronto para a Ilustração Iluminista reforçar ainda mais o Humanismo. França e Inglaterra na direção de uma ‘nova filosofia’ universal, mais adaptável ao tempo moderno. São desse período, pensadores como Voltaire, John Locke, Rousseau, Montesquieu, Adam Smith, depois Kant, entre outros. Junto aos demais já citados, responsáveis por parte significativa do que pensamos, acreditamos, reproduzimos e praticamos hoje, tudo somado ao cientificismo e contribuição de Darwin. Três grandes momentos da história moderna concretizaram de vez essa via, esse caminho até o contemporâneo. Falo da Independência dos Estados Unidos, da Revolução Francesa e da Revolução Industrial Inglesa – e eis o capitalismo na sua forma mais abrangente e dinâmica (segundo o historiador Eric Hobsbawn, a ‘única’ revolução mundial foi a Revolução Burguesa). Todos com fortes traços Iluministas. Filhos desses momentos históricos e soma de todas essas idéias e/ou filosofias – e ideais – são os pensamentos utópicos e ‘revolucionários’, os ditos socialismos: utópico, libertário (ou anarquismo) e científico. Tomas Morus e Erasmo de Rotterdam deram um primeiro sussurro do que viria a ser a sociedade igualitária, antes mesmo dos ilustradores iluministas desenharem suas teorias. Depois vieram os pensadores ditos utópicos, que já propunham uma sociedade de cunho socialista: Saint-Simon, Charles Fourier, Robert Owen, entre outros. Vestígios do que viria a ser o socialismo libertário (anarquismo clássico) vem também da Grécia Antiga. Os ‘banidos’ e/ou ‘amaldiçoados’ filósofos cínicos como Diógenes de Sínope e Crates de Tebas, advogaram por formas anárquicas de sociedade, mas pouco resta de seus escritos, obscurantizados pela filosofia iconizada de Platão, Aristóteles e Sócrates. Foi com pensadores como Proudhon, Kropotkin, Bakunin, Max Stirner, Errico Malatesta, Emma Goldman, Louise Michel, entre outros, que o anarquismo criou corpo prático. Disso surge o anarco-comunismo, anarco-feminismo e a primeira ação sindical da história, o anarco-sindicalismo. Nos Estados Unidos, o pensamento libertário tem marca forte no nome de Thoureau e sua ‘Desobediência Civil’, obra que viria a influenciar lutas de libertação (e abandono) pelo mundo todo. O socialismo científico (ou comunismo), foi uma teoria desenvolvida pelo sociólogo e filósofo Karl Marx, em parceria de Friedrich Engels. Essas teorias libertárias influenciaram vários movimentos, revoltas e revoluções pelo globo. Entre elas podemos citar a Comuna de Paris, a Guerra Civil Espanhola, Revolução Russa, Cubana, Chinesa, entre outras. Contemporâneo a Marx e a alguns anarquistas, Friedrich Nietzsche criticava ambos os socialismos, assim como todo o racionalismo e cientificismo vigentes na época, além do cristianismo e da moral judaico-cristã, muito presente ainda nos dias atuais. Nietzsche, de um modo geral, no meio de toda essa convulsão teórica, dessas turbulências ideológicas e atividades revolucionárias eclodindo pelo mundo, teceu duras críticas aos seus contemporâneos, os quais, para ele, eram (ou pelo menos a maioria), reprodutores da concepção judaico-cristã de sociedade, tendo fundamento no idealismo filosófico, comprovado na crença e busca da ‘sociedade ideal’ (ou perfeita), um tipo de paraíso terrestre. Para Nietzsche, até o marxismo e o anarquismo tinham (ou tem) fundo cristão e/ou idealista, circundados pelo pensamento platônico e aristotélico, entre outros. Grandes pensadores surgidos depois desse debate/embate teórico hoje são discutidos e utilizados nas problemáticas da humanidade. Além de Nietzsche, Thoureau e Marx  (depois releito e reforçado por Gramsci, Walter Benjamin e a Escola de Frankfurt), três dos pensadores mais problematizados e ainda utilizados atualmente, independente da forma e espaço onde e como isso se dá), temos nomes como Foucault, Deleuse, Derrida, Bauman, Debord, entre outros, que são muito estudados e aplicados em teses e práticas sociais, culturais, acadêmicas e afins pelo mundo, todos, de certo modo, influenciados, direta ou indiretamente pelos pensadores citados acima. Porém, apesar dessa ‘ótica’ (um tanto sintética), se atentarmos e fizermos uma leitura crítica do cotidiano e das relações de poder que exitem nele, inclusive na superestrutura (niveis políticos-ideológicos-religiosos-culturais), fica visível a prevalência, na esfera da herança ancestral filosófica, do pensamento grego de Platão e Aristóteles. Além disso, temos a carga racionalista cartesiana muito presente (leia-se Descartes), além dos valores e concepções judaico-cristãos que vigoram acima de qualquer forma de desconstrução sócio-cultural a nível de pensamento e concepção.

 


Não, ouça, o que aconteceu foi o seguinte: eles mentiram para ti, venderam-te idéias de bem & mal, fizeram-te perder a confiança em teu próprio corpo & sentir vergonha por teus dons de profeta do caos, inventaram palavras de desprezo para teu amor molecular, te hipnotizaram com distrações, te entediaram com a civilização & todas suas emoções usurárias”. (Hakim Bey)

 

 

Por mais que existam pensadores ainda não (e talvez nunca) enfatizados no âmbito das inovações teóricas e contestação (se bem que as atuais práticas de movimentação culturais-políticas que andam surtindo efeito, vem daí), como Hakim Bey, por exemplo, ainda é certa ‘tradição’ e/ou valores tradicionais-clássicos que prevalecem na ordem do dia do pensamento ocidental. Talvez o super-homem a que Nietzsche desenhou no seu Zaratustra, sendo a própria superação de si (e não alguém superior pela raça ou força física, como o quis o Nazismo alemão de Hitler – mas sim, pela força interna de negação e destruição dos valores estacionados na tradição milenar), esteja ‘descançando’ na maldição de poetas como Rimbaud, que ficou caracterizado como o anti-herói da poesia moderna, que está além das palavras e formas – ou seja, na linguagem, na destruição do passado tradicional e na construção de um momento moderno-atual. Rimbaud, eu o vejo: é o andarilho que Nietzsche traz como o super-homem, livre das redomas do passado e pronto para um novo tempo – um agente do Caos a que Hakim Bey a todo momento cita nas entre-linhas do seu personagem que só existe enquanto narrador oculto na própria falta do ‘eu’. Na prática, Rimbaud enquanto existencia e trajetória, foi a negação do ídolo (e consequentemente, do seu culto), pois, ao contrário de um ‘deus’ redentor de toda a humanidade, aspirado pelos idealismos e filosofias que iconizam um ídolo salvador e/ou revolucionário (seja Jesus, Lênin, Hitler, ou quem for), um paraíso, ou no mínimo, um lugar melhorado de mundo – mas sem destruir as bases ordinárias deste mundo, apenas reformando-as – foi o andarilho que abandonou a casa para viver o risco, em busca do novo, de novas experiências que o pudessem tornar senhor de si mesmo - de si próprio, deixando a maldição de seu nome e sua tragetória como herança maldita, além de uma linguagem nova e ainda pouco compreendida ao mundo, algo que realmente gera movimento, caos, transformação, e não apenas reformas. Se as bases são as mesmas, pouco adianta (ou nada adianta) mudar as formas. É preciso desconstruir, ou se preferirem, destruir uma estrutura, para então criar algo novo que realmente seja contemporâneo, no seu sentido mais utópico, profundo e/ou sincero de ser.

 


“(...) uma das primeiras coisas a compreender é que o poder não está localizado e que nada mudará na sociedade se os mecanismos de poder que funcionam fora, abaixo, ao lado dos aparelhos de Estado, a um nível muito mais elementar, quotidiano, não forem modificados”. (Michel Foucault)



Bem, já divaguei demais, entrei em caminhos obscuros, terrenos inóspitos  e outros quase impossíveis. Mas, o que eu quis com tudo isso? Não vou responder, pois não tenho respostas: “Não sou um homem de respostas!” (certezas e convicções? Muito poucas! – alguma luta...) – disse hoje a uma aluna que me perguntou algo que não pede respostas dadas, e sim, dúvidas e buscas.


Obs.: Sim, é claro, deixei de fora alguns ‘personagens’ importantes dessa feijoada acidental. Eles gritam por detrás dessas linhas tortas... Ouça!



"Eu tô te explicando/Prá te confundir/Eu tô te confundindo/Prá te esclarecer" (Tom Zé)



Herman G. Silvani

 

 

 

Um comentário:

Marco Antônio Kauff disse...

Que foda!