Olho nos olhos quando quero a verdade. Olho pro chão quando quero
fugir da verdade e pro céu quando não quero nada. Nos olhos estão as vontades,
as necessidades e as virtudes escondidas. Nos olhos do assassino dá pra ver
seus medos. Nos olhos do poeta, todo o tédio pelo mundo. Tédio que o faz compor
seus versos. Nos olhos da doméstica todo o seu cansaço e no do doente, toda a
sua angústia. Olhos são janelas para o mundo. Olhos são janelas de um mundo
para outro. Fecho os olhos quando quero que o mundo desapareça e os abro quando
quero que ele aconteça. O mundo acontece o tempo inteiro diante dos meus olhos
abertos e deixa de existir quando meus olhos se fecham. Todo o carinho que
necessito para continuar sendo humano está nos olhos dos que me amam e dos meus
cães.
Uma criança me olha enquanto eu falo. Chama pelo meu nome e quando
atendo, não diz uma só palavra. Pelos olhos ela fala, e seu olhar é terno, sereno,
verdadeiro. Um olhar que dispensa conceitos, interesses, intenções. Há poesia
no olhar da criança como há sorriso no olhar dos cães. Há dor no olhar dos que criam, há alegria, há
esperança, há vida. Há ódio no olhar dos que ambicionam poder. Há frustração no
olhar dos que invejam, acomodados em suas decepções por não terem um pouco de
caos dentro de si. Há música no olhar dos velhinhos que adoram dançar
descalços, contarem causos e rirem da vida que passou, sabendo da pouca que
ainda resta. Há brilho no olhar dos que lutam por uma humanidade que ainda não
chegou e talvez nunca chegue. A luta, mesmo nunca sendo branda, traz em si uma
alegria libertadora que faz o sorriso ser pleno. Alguém me disse um dia que
tenho certa tristeza no olhar. Mas não o tempo todo. Sofro de sensibilidades
agudas, mas não tento matar a tristeza nem tampouco evidenciar a alegria que também
existe em mim. A natureza me fez assim. O mundo me fez assim. E eu vejo o mundo
com os olhos que sou.
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