Publicação e bom senso
Alguns acham que, por escrever e ser publicado em jornais e outros meios
sou jornalista. É fácil confundir cronista com jornalista. Mas tudo bem,
respeito, considero e até admiro alguns jornalistas. Poucos, para ser sincero,
mas dignos com a palavra, as ideias, informações, com a linguagem e a
comunicação. Não que eu não goste de ser confundido ou comparado aos
jornalistas, mas, é que, de fato, não sou. Já que toquei no assunto, tenho
provocações e algumas críticas ao jornalismo e aos jornalistas, da forma que
eles são, pelo menos em sua maioria, penso eu. Nietzsche, um dos meus mestres
na filosofia pontua o jornalismo como uma ‘cultura’ superficial: "O jornalista, por seu lado, representa
a pseudocultura, a aceleração, a indisciplina intelectual, a superficialidade,
a imaturidade (...) é o que opina sobre tudo e sobre todos, o que fala de
qualquer coisa, o que tem opiniões próprias, mas nada mais que opiniões (...) é
o que se subordina às leis da moda, às demandas do mercado, ao gosto da opinião
comum. E produz afetação, autossatisfação e opinionites, e a ilusão vaidosa de
ter uma personalidade livre e um pensamento próprio e original." ('Nietzsche
& a Educação' - Jorge Larrosa), o que sem generalizar, é claro, eu concordo
(parcialmente). Também ‘dou’ opiniões quando ‘teço’ comentários escritos,
análises, pensamentos, problematizações, provocações em forma de crônica.
Porém, tenho plena consciência de que elas, as ‘opiniões’, quase nunca são
‘próprias’, pois, como sempre digo aos meus alunos, elas provém de algum outro
lugar, para além do ‘eu’ ou da ‘ideia’ pessoal. A filosofia (pelo menos aquela
que defendo e promovo) tende a superar a mera opinião. O que existe são as
‘referências’ e ‘conteúdos’ que, sintetizados ou não, geram outros conteúdos e
impressões. Eis o fundamento de escrever e publicar. Nada vem do nada em se
tratando de conteúdo escrito ou dito. Por isso, é fundamental certa
sensibilidade, certo primor no uso das ideias. Para isso, além das leituras e estudos, é necessário o bom uso
dos sentidos. Sentidos apurados e bem tratados. Nisso, intuição e instinto,
além da razão, devem ser considerados. Ou seja, respeitar, compreender, relevar
e considerar a natureza, além do fator cultural. Um equilíbrio entre natureza e
cultura pode gerar um pensamento mais, digamos, interessante e livre, e menos
doutrinário ou segmentado. Superar o dualismo platônico que resulta em
determinismo e reducionismo da ideia, do pensamento, da palavra e da linguagem,
é o caminho para um ‘publicar’ (compartilhar ou socializar) mais dinâmico e coerente
com a amplitude e profundidade do mundo. Nietzsche também diria que "Para ler bem, é preciso ter todos os
sentidos afiados" (e leia-se 'ler' aqui como 'leitura de mundo', para
além das páginas impressas). Nisso, o jornalismo, geralmente peca. Se não dá
para aprofundar o conteúdo publicado, que pelo menos se aponte as referências
para uma busca mais profunda, ou se permita isso através do bom uso da
linguagem. Eis que, com isso, sigo a risca um ensinamento de outro mestre: "Nunca teste a profundidade de um rio
com os dois pés" (Confúcio), para que eu tenha pelo menos, minha
parcela de ‘bom senso’ naquilo que publico garantida.
* também publicado no jornal Gazeta de Chapecó.
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