quarta-feira, 21 de agosto de 2019

O espírito cinza de um país que queima transtornado


A comemoração do governador do RJ, Wilson Witzel pela morte de um jovem negro, pobre e que cuidada da propriedade dos outros (era vigilante), no episódio do sequestro do ônibus sobre a ponte Rio-Niterói - comemoração esta também do atirador, jornalistas e outras pessoas que no local estavam (em casa também tiveram os que vibraram) - retrata a face de um país dissimulado, decadente e transtornado em seus valores morais. 

O mesmo governador, é aquele que, junto com a polícia, num helicóptero, participava de uma operação onde atiravam de fuzil contra a população negra e pobre de uma favela. O mesmo que sobre a morte de adolescentes negros e pobres dias atrás, disse que 'alguns vão morrer', acompanhando o discurso do presidente Jair Bolsonaro. O mesmo que, no ato da quebra da placa que homenageava Marielle Franco (mulher, negra e ativista dos Direitos Humanos), comemorou. Atitudes típicas do fascista, e que está no poder (como outros que neste momento atuam no país), sob os olhos e participação da 'justiça' brazileira e de muitos brazileiros que se esbaldam com a tragédia alheia.

Sim, o sequestrador colocou em risco outras vidas, e por isso teve sua vida encerrada. Até aí, o fato se explica e a ação da polícia se justifica. Agora, comemorar a morte é algo estupidamente depravado.
Vivemos um tempo de 'espetáculo' midiático, onde tudo se filma e se publica, seja pela rede social ou pela TV. Onde juiz, polícia, governador, presidente, etc., agem como 'pop-stars'.  Onde tudo se torna show, discurso, publicidade, espetáculo (leia-se ‘Sociedade do Espetáculo’ de Debord). Onde a moral, a discrição, o equilíbrio e o bom senso, dão lugar ao bizarro e ao discurso moralista da palavra e da imagem.

O sequestro em seu desfecho não foi trágico (não pelo menos para os sequestrados). Graças a ação acertada da polícia? Sim. Mas também ao caos. Ou seja, a circunstância. O sequestrador foi atestado com problemas psicológicos. Não feriu ninguém. Estava transtornado. Participou do 'espetáculo'. O trágico foi a atitude do governador, de alguns policiais, jornalistas, mídia e populares, que engrossaram o discurso de ódio ao 'preto-pobre-transtornado' ao comemorarem sua morte. Há quem diga que comemoraram o desfecho. Mas, o desfecho também foi a morte.

Num contexto maior, o jovem, também foi uma vítima (por estar nesta condição de transtorno mental e social), que fez outras vítimas, ambos frutos de uma sociedade transtornada - e espetacular, governada por demagogos e moralistas. Como num filme comercial e publicitário de Hollywood, Witzel, o governador, desce de um helicóptero, vibra como que comemorando um gol numa partida de futebol, e profere para a mídia televisiva um discurso típico do moralismo do cinema ideológico hollywoodiano.

Nossa realidade, nossa cultura, sofre de transtorno (numa concepção taoista, o ‘espírito deste tempo’), onde o ódio e o fetiche pela morte (do pobre-preto-transtornado) são o prazer dos dementes. É o fascismo demente brazileiro no seu ápice. Comemora-se, ri-se do paliativo enquanto o problema real continua. É acima do problema que eles, os bizarros e dementes que governam, fazem seus showzinhos e mantém-se em evidência. É o governo do bizarro. E as bizarrices continuam. Enquanto o país queima em cinzas e transtornos...




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