segunda-feira, 28 de março de 2011

As amoras e o mundo


Atrás da minha casa tem um pomar. Pequeno, porém, produtivo. Sempre acho um tempo para ir até ele e colher algumas frutas frescas. Frutas colhidas do pé têm outro sabor. Comidas debaixo do pé então, nem se fala! No pequeno pomar atrás da minha casa tem um pé de amoras pretas. Agora está na época das amoras pretas. Me junto aos sabiás e outros pássaros para comer amoras. Moro praticamente no centro da cidade e acreditem, atrás da minha casa tem amoras e sabiás. Adoro amoras pretas! Quando quero fugir um pouco da vida citadina, urbana, vou até o pequeno pomar atrás da minha casa colher amoras. Isso se tornou uma prática quase que cotidiana na minha vida cheia de compromissos com a educação, a informação e a cultura. Colher amoras no pomar atrás da minha casa também é cultura. Saber que lá ainda cantam os sabiás e ouvir os seus cantos é tão importante quanto à informação oficial de todo o mundo. Cultivar um pomar por menor que seja onde existe um pé de amoras e sabiás que cantam faz parte de uma educação tão importante quanto à educação formal de toda a sociedade. Eu colho amoras. Eu cultivo um pomar atrás de casa. Pequeno. Eu tenho ouvidos para o canto dos sabiás. Eu sou um ser urbano e muito mais do que isso. Contrário a lógica de qualquer mercado, de qualquer tipo de civilização burocrata e tecnológica, eu como amoras. Eu ouço sabiás que cantam. Logo, eu sou um criminoso. Sim, um criminoso. Cometo atentados contra a ordem superficial das coisas. Não me contento em ser útil apenas. Quero colher e comer amoras pretas, bem debaixo do pé e de pés descalço, sentir a terra entre meus dedos. Quero degustar todo o sabor dos anos incrustado nas amoras pretas, ouvindo os sabiás cantando. Estar de folga e inútil para o mundo das coisas. Me lixando para a economia e a política do mundo. Esquecendo que existe futebol, novela e sertanejo universitário. Por algum instante ninguém sabe que eu existo. A importância do mundo está no sabor das amoras pretas e no canto dos sabiás que estão no pequeno pomar que tem atrás da minha casa... Porque eu ainda sinto sabor no mundo!

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