domingo, 8 de julho de 2012

“A luta do século” (ou ‘Gerações em conflito’)














* Um continho contemporâneo de ficção para dias mais felizes - ou um delírio crônico meu para o divertimento da espécie...

O pai não via a hora da luta começar. Passou dias na espera. Até na hora da transa habitual com a mulher tinha flashes da dita luta. No transito chegou a quase bater o carro distraído pensando no grande momento. Já o filho, ao nascer vestiu, mesmo sem saber do que se tratava, a camiseta do time do pai. O orgulho do paizão era esse filho: “Esse vai ser jogador de futebol! Artilheiro! Assim como o Neymar! Se não for jogador, então vai ser lutador de MMA! Um campeão! Assim como o Anderson Silva! Vai viver cercado de mulher e ter uma vida boa! Vai se dar bem na vida o garotão!”. Mas o pai, orgulhoso de tudo isso, não era nada disso. Nunca foi bom no futebol - quem dirá na luta! - e também nunca se deu bem com as mulheres. Acabou estudando administração e montando uma empresa de seguros. Na semana da luta, compartilhava numa rede social toda sua angústia e desejo quase incontrolável pela chegada do dia daquela que foi chamada intencionalmente pelo narrador-publicitário da maior rede de tevê nacional como “A luta do século!”. Chegou o dia, e o dia parecia interminável. As horas passaram se arrastando e o pai quase teve um colapso nervoso. Mas sobreviveu. Ficou acordado até a madrugada incentivando o filho para ver o ‘espetáculo’ que segundo ele seria. Semanas, dias e horas de espera. Até que enfim a luta começou, e em alguns minutos terminou por nocaute técnico. O filho sonolento, mas um tanto vidrado, menos que o pai, porém, muito curioso, como a maioria das crianças que ainda mantém certo interesse e dúvida pelas coisas dadas, iniciou um diálogo com o pai: ‘Terminou pai?’ O pai: 'A luta do século' acabou!’ O filho: ‘Mas... Foi só isso pai? O pai: ‘Claro filho, esperava o que?!’ O filho: ‘Ah, sei lá! Algo mais empolgante! Uma luta melhor! O cara errou a cotovelada, caiu e ficou encolhido esperando o outro bater nele!’ (silêncio por parte do pai). Nisso, o narrador da televisão, numa euforia adestrada grita: 'Os gladiadores do terceiro milênio!' E o filho pergunta ao pai: ‘Mas cadê os leões pai?’ (mais silêncio por parte do pai que pensou: ‘Malditas aulas de história!’). O narrador prossegue num tom de satisfação, vingança e ódio: 'A luta do bandido americano contra o herói brasileiro!' O filho volta a perguntar ao pai: ‘Quem o lutador brasileiro salvou pai?’ (silêncio e suor por parte do pai). Nisso, uma voz rouca e enfraquecida grita da cozinha: ‘Não salvou ninguém meu neto, mas aliviou as frustrações e o orgulho ferido de parte do povo brasileiro. Pelo menos pra agora! Amanhã é outro dia e eles estarão mais calmos e obedientes para irem aos seus trabalhos, mansinhos, mansinhos... Mas daqui um pouco a frustração volta todinha...' O filho constrangido pela falta de respostas do pai, olha para ele - que agora deprimido desliga a tevê - e diz: ‘Pai, vou dormir, ainda sou criança e não entendo esse seu mundo de faz de conta’.


* Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência (como se fazia nos 'bons tempos' da ditadura militar...)




4 comentários:

Anônimo disse...

Cara vai planta batata se vc ñ tem oq faze!

Herman ou Niko (denovo) disse...

putz! bicho.. ótima contribuição! parabéns! preciso estudar seus argumentos para entendê-los.. pode deixar que vou pensar sobre eles.. ah vou.. sim.. claro! ..como dói né? eu entendo.. quando a crítica recai sobre aquilo pelo qual somos cegamente apaixonados, dói.. é o 'sagrado' perdendo a 'pureza' (ou virgindade).. mas não é um estupro, apenas uma penetração, de leve, tem coisa bem pior.. há de se superar!! ah.. e falando em batata, planto sim, só se for... bem, deixa pra lá..

Camila Dias disse...

Mas nem a literatura é poupada pela cólera alheia? Eita mundão!!

Herman ou Niko disse...

é a tolerância (fundamental nas artes marciais, diga-se de passagem) que alguns andam praticando Camila.. além da jóia das suas 'argumentações'.. eita!!