sexta-feira, 6 de julho de 2012

Casei com a noite
















Eu sou a favor do casamento gay. Desde que eu possa comer e beber de graça. Aliás, se for nesta condição, me boto a favor de todo o tipo de casamento – mas me convidem, viu?! Não, não é preconceito meu. É porque casamentos não me dizem respeito. Pra mim, as pessoas deveriam apenas se reunir ou unir, conforme suas afinidades, suas necessidades e seus sentimentos, tudo com muita sinceridade e sem rodeios ou idealismos. As convenções servem muito para a manutenção de um modo de vida equivocado. Mas tudo bem, eu respeito. É tradição. É jogo. Faz parte -  dizem! Tenho cá minhas dúvidas. Mas, vou dizer que sim para que você se sinta bem. Quem sou eu pra dizer o contrário, não é? Vejam só! Um cronista. Simplesmente um cronista. Um reles mortal que ganha seus dias escrevendo isso - crônicas.  Um poeta do absurdo que volta e meia arrisca em versos errantes. E eu sempre erro. O resto é certo – se é que resta alguma coisa! Mas como eu ia dizendo, sou a favor. Sim, a favor. Só isso – a todos os casamentos do mundo desde que não me deixem de fora. Adoro a farra. Comer o bolo, beijar a noiva e tombar de porre. Um belo programa para um final de semana entediante. Ação. Ação é saber que se está vivo e em movimento. Ontem eu também casei. O nome da felizarda: ‘Noite!’. Ela é negra. Ela é linda. E tem certo brilho no olhar. Os gatos fazem dela sua mãe protetora quando saem à caça. Os bandidos se ocultam em sua sombra. Os amantes se embriagam de prazer sob seu céu. Ela é negra. Ela é linda. Eu penetro nela todos os dias - aliás, todas as noites. Ela sempre vem pra me afagar. Me trazer sono e descanso. Me tornar mais calmo e distante desse mundo sujo cheio de gente limpa. Eu não suporto as gentes limpas que desprezam a noite. São tão sem graça com seus olhares de neve. São tão sem risco. Seus sorrisos de tão frios parecem não ter vida. Essa gente limpa. Que se acha limpa. Como ser limpo vivendo num mundo sujo? Mas há beleza ainda neste mundo. Nem tudo está perdido. A Noite quando vem, me traz essa esperança. Sem palavras, ali, no silêncio da sua negritude. No infinito da sua existência. E eu penetro nela. E eu passo a integrar seu predomínio notívago. Seu manto cobre o mundo e eu me cubro com ele. Sou um homem casado e ela se chama Noite. Não, no nosso casamento não houve festa. Nem comida, nem bebida. Apenas, nossa união. Apenas nosso delírio e a cegueira que ela trouxe consigo. Eu casei com a Noite e já não tenho mais medo do escuro.



Nenhum comentário: