quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Sistema de Castas na Educação: um profundo e irredutível estudo a partir de Nietzsche e Marx


Introdução

Lendo um filósofo de ‘pouco nome’ - destes ‘malditos’, outrora chamados de ‘cães filósofos’ (a modo de alguns pré-socráticos) - que são extirpados pelo status quo e geralmente malquistos nas universidades badaladas - mundo afora, Brasil adentro - cheguei onde ele falava do sistema de castas, e relacionando, ao veredicto torpe (e foi-se minha última garrafa de Malbec contrabandeado) de que, aqui no Brasil também possuímos nosso(s) sistema(s) de castas. Mas o nosso é diferente do que o da Índia, por exemplo (neste momento, um amigo marxista-religioso e sabe-tudo, pelas costas me grita: ‘Ah sim, são as classes sociais, a burguesia e o proletariado!’. Internamente respondo: ‘Não, não é diretamente a isso que me refiro. Mas, se assemelha muito’. Falo das castas (ou classes) dentro de uma mesma profissão, neste caso específico, a dos professores. Sim, elas existem, as castas! De um modo geral, professores são divididos entre universitários e colegiais - para além da nomenclatura ou localização espacial - o que é pior: divididos por um status dito intelectual e que também acaba sendo social e cultural. Uma divisão que vem de cima para baixo, hierarquicamente, a partir da titulação (ou das graduações). Um status que confere a professores universitários certo poder, um poder hierárquico de tipo classista, independentes dos seus gostos ou convicções (mas muitos gostam, e como!), a partir dos diplomas (e sua indústria). Diplomas estes que os ‘autorizam’, ou seja, lhes dão ‘autoridade’ sobre determinados assuntos (o que seria um tanto justo, não fosse certa realidade na educação, tanto colegial quanto universitária, e nas relações de poder) mas, mais que isso, uma autoridade em decisões grupais dentro da própria categoria que, assim, já não é mais uma única e unida classe que, em tese, por estudar, possui sua ‘consciência de classe’ (como lindamente sonhou Marx), mas uma categoria dividida em duas classes ou castas distintas, onde uma sobrepõe seu status sobre a outra, dentro de um sistema de valores hierárquicos que se mantém, se afirma e se reproduz - e aí sim, a meritocracia tão criticada por muitos passa a ser justificada e aceita, até tornada ‘justiçamento’, conciliável a certa acomodação profissional (o discurso muda conforme se altera certa realidade pessoal). Uma autoridade hierárquica que autoriza mestres e doutos, nos altos de suas titulações  e atribuições (e Platão ri-se satisfeito pelo seu dualismo idealista ser tão cultivado, onde o mundo real pertence aos ‘seres de ideias’, mesmo que elas não sejam só suas – ou bem suas), e os autoriza sob tudo, no discurso. A prática? Bem, a prática é outra ‘estória’ – o mundo das coisas não é real (mais risos de Platão se ouvem do além).

Desenvolvimento

Contrapondo isso, o filósofo/filólogo alemão F.W. Nietzsche diz que o ‘eruditismo exagerado’ pode tornar o conhecimento petrificado, uma imobilização do presente em nome de um passado sempre revisitado, quando não saudoso e idealizado. Outro fator da crítica do filósofo ao ‘eruditismo acadêmico autorizado e forjado pela titulação’ são os ‘especialistas’ que, tornam-se fragmentos de um todo particularizado e distribuído para que este todo jamais volte a ser percebido e/ou pensado como sendo-o. Ou seja, um ‘especialista’ é um instrumento da segmentação e fragmentação de conhecimentos compactuados, o que soma nas ideologizações e não na amplitude e diversidade do pensamento, do conhecimento e das linguagens. Em relação a isso, Nietzsche também nos diz sobre o erudito:

(...) não faz outra coisa senão revolver livros (...), acaba por perder íntegra e totalmente a capacidade de pensar por conta própria. Se não revolve livros, não pensa. Responde a um estímulo (um pensamento lido) quando pensa, - ao final a única coisa que faz é reagir. O erudito dedica toda a sua força a dizer sim ou não, à critica de coisas já pensadas – ele mesmo já não pensa... O instinto de autodefesa abrandou-se nele; em caso contrário, defender-se-ia contra os livros. (LARROSA, p. 31, 2009)
Para Nietzsche, o especialista é “Prisioneiro do ponto de vista único que domina e que o domina, escravo dos caminhos trilhados que conhece a dedo mas que impõem a ele o seu percurso”. (LARROSA, p. 31, 2009)
Na sua obra ‘A Gaia ciência’, poeticamente Nietzsche intitula especialistas e literatos (os que correspondem aos eruditos e aos jornalistas) de “consumidores e produtores de livros que não fazem dançar”.

Considerações Finais

No sistema de castas brasileiro, de um lado temos os intelectuais eruditos especialistas universitários, de outro, os professores colegiais (ambos suscetíveis a ouvirem sertanejo universitário).
Sim, tudo isso pode ser um grande equívoco ou exagero - ou não. E Marx? Bem, Marx, para quem o sabe, está bem dito nas entrelinhas (e para além delas).

Conclusão (um tanto óbvia):

Aqui não é a Índia, mas também temos nosso sistema de castas.


Referências

LARROSA, Jorge. Nietzsche & a Educação. 3 ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2009.

SILVANI, Herman G. Niezsche & Marx: uma gota de paz em tempos de peleias oceânicas. 95 ed. Xapecó: Clandestina, 2015.

Πλάτων (Platão). O comedor eruditizador das galáxias. 2000 ed. Atenas: Ideal, 400 a.C.



* primeira parte deste 'estudo' adaptado e publicado em forma de crônica no jornal Gazeta de Chapecó.




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