Crianças...
Crianças dão cor ao mundo. Crianças
são anjos do caos que de pés descalços juntam-se a natureza para um ritual
divino. Crianças correm, pulam, dançam, cantam & resistem ao mundo formal e
burocrático dos adultos com flores nas mãos. Crianças dão luz à escuridão da
humanidade. Crianças trocam olhares secretos à mesa de jantar enquanto os
adultos tagarelam por detrás de suas máscaras. Crianças são frágeis terroristas
cujas bombas espalhafatosas são seus sorrisos sinceros. A diferença entre uma criança
pobre & uma criança rica se define pelo aprisionamento familiar, naquilo
com o que o mundo adulto se escravizou (e tenta escravizar as crianças) – suas
propriedades materiais. Eu tenho em mim uma infância selvagem (além da melhor
lembrança viva). Crianças com suas fantasias podem voar. Com isso causam inveja
ao adulto rude e viciando nos costumes da submissão. Crianças são como cães e
pássaros que fazem por necessidade sem pretensões ‘civilizadoras’ [de
obediência. Um coro sonoro de crianças que correm e gritam na rua é a própria
voz de deus - é a natureza acontecendo. Crianças e cães conversam pelo olhar
& longe de qualquer influência pegajosa dos meios de alienação, as crianças
podem existir realmente, no seu estado próprio de ser. Eu amo as crianças que
se escondem debaixo da cama esperando o momento certo para um susto divertido.
Eu amo as crianças que brincam sorridentes de pega-pega no pátio de uma escola
qualquer. Eu escrevo poemas por que as crianças existem, e o amor delas é um
amor selvagem, sem o moralismo do amor-propriedade adulto. O amor das crianças
é a cura de toda a violência moral-habitual. Quando um adulto machuca ou mal
trata uma criança, o mundo inteiro sangra, os cães choram e os pássaros
silenciam - & quando uma criança está feliz, o mundo todo dança, os cães
abanam seus rabos sorrindo e os pássaros cantam para o infinito. Às vezes o mundo
adulto me envergonha, e sinto que, se não fossem as crianças, a humanidade já
estaria findada. Às vezes, sou criança & me divirto sonhando com coisas ínfimas.
Coisas que me trazem de volta o riso do rosto sujo da criança selvagem.
Herman G. Silvani
* re-publicado no jornal Folha do Bairro - 12/10/2012
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