Algum filósofo, o qual não lembro quem, anotou que na cultura
humana há uma divisão que a distingue e a caracteriza em dois grupos: 1. o da
virtude; 2. o do vício. Nisso, estive
pensando sobre a prevalência do grupo 1 sobre o grupo 2. Ou seja, existe muito
mais viciado do que virtuoso nesta sociedade, cultura ou mundo. E isso explica
boa parte da atitude das pessoas que, na primeira motivação governamental-empresarial,
em plena crise viral onde o risco de contaminação é iminente, retornam correndo
para seus trabalhos. Essas pessoas são doentes, pois são viciadas. Sim,
drogadas, fissuradas, adestradas, viciadas ao servilismo. Aprenderam assim e se
veem loucas quando necessitam parar por alguns dias. Outro fator agravante para
tal atitude irracional é a ansiedade, característica típica do nosso modo de
vida que concorre e disputa mais do relaxa e descansa, motivada pelo comércio e
sua publicidade excessiva. Isso, somado, é claro, a ambição ou ganância. O medo
também é outro fator. Porém, medo, eu também sinto, todos sentem. Então talvez
seja o menor dos fatores.
Mas, o fator principal aliado ao vício, é que boa parte destes
pais e mães de família não suportam a própria vida que levam. Ou seja, não
aguentam suas condições existenciais e recorrem para as ilusões, alienações,
ocupações servis. O sistema é seu grande deus, que os abraça, e como Zeus no Olimpo,
joga com suas vidas. E eles aceitam o risco, pois suas realidades cotidianas
são tão insuportáveis como casal, pais, consumidores, cidadãos, homos sapiens
que não necessariamente sabem que sabem, que acabam optando pelo risco da
doença e até da morte do que pela calmaria e pela vida familiar. Ter que passar
o dia e noite toda junto da esposa e dos filhos, bichos de estimação, paredes
do apartamento, é uma tortura para tais e quais (isso também serve para muitas
esposas referente aos seus maridos). Por isso é que a família em grande parte
dos casos é uma fachada, um discurso, uma mentira. O ‘estereótipo da família
feliz - e pequeno burguesa’, a também chamada ‘família de bem’. E estas pessoas
tem o poder de se auto-enganar, de se auto-mentir. Este tipo de viciado é
irracional e age por ondas de emoção suscitadas por alguém ou algo que os quer
dominar ou domina, e pela publicidade e/ou ideologias de controle.
E agora estamos todos nós presos a este risco, devido a
hipocrisia e a estes viciados que sempre fugiram dos tratamentos (sim, existem
a Arte e outras filosofias ou modos de vida que curam). Continuar nas suas
vidas medíocres de auto-engano e de aparências prepotentes ou vaidosas,
escravos de certas crenças e práticas (sendo o trabalho da forma que é, uma
delas), é o que, no fim, acaba botando em risco suas próprias vidas, e pior, a
dos outros também. Se ficassem em casa (muitos do que estão saindo poderiam), e
neste momento de ‘isolamento social’ buscassem mudar, melhorar, crescer
internamente e mentalmente, desenvolvendo novas possibilidades e conhecimentos,
novas percepções, ou seja, tratando seus vícios rumo a se tornar pessoas mais
virtuosas, depois da crise epidêmica (que vai passar – infelizmente não para
todos/as), poderiam ser agentes de uma nova cultura, de uma nova sociedade ou
civilização, mais digna, sensível, equilibrada. Mas, falta-lhes coragem para
isso (e talvez sanidade). Enfim... Aos viciados sobreviventes, que se tratem e
se curem, aos virtuosos, minha admiração e respeito, seguimos juntos, mesmo
distantes...
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