As ruas estão cheias. As bocas estão cheias. Palavras ao vento.
Inúteis. Ora cruéis, ora redundantes. Ora mudas. As ruas estão cheias. Corpos que
trafegam sem rumo ou rumando a lugar nenhum. Avenidas tomadas por um desespero
cotidiano, por um passar de olhos sem alvo, sem brilho nem visão. Olhos que,
dispersos num nada absoluto, dão em anúncios publicitários – banalidades do
dia-a-dia. As ruas estão cheias assim como alguns corações repletos de dor e
ódio. As ruas estão cheias de consumidores afoitos esperando o próximo sinal
abrir ou o próximo ônibus passar. Irão aos shoppings, aos bancos, aos salões de
beleza e as lanchonetes também encher, além das ruas, os estômagos famintos –
com essa gordura que incha ou tranca as veias da cidade – como as suas
próprias. As ruas estão cheias de amarguras, cães pestilentos e famintos, como
os mendigos que por elas divagam. As ruas estão cheias de belas jovens
estudantes que desfilam seus andares de coxas desnudas sob os olhares também famintos
dos depravados espectadores, donos de comércio ou vigilantes diurnos. As ruas
estão cheias de contradições e de promessas que jamais serão cumpridas. As ruas
estão vazias de crianças que, trancafiadas em apartamentos ou confinadas por
detrás das grades escolares, num futuro próximo encherão ainda mais as ruas que
estão quase vazias de sentido - enquanto os carros enchem as ruas de petróleo e
olhares de ambição. Mas esse é apenas um dos vários desenhos das ruas - &
nesse desenho as ruas estão cheias de mentes vazias...
* também publicado no jornal Folha do Bairro, 02/08
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