quarta-feira, 20 de maio de 2015

Leituras do Cotidiano

O paraíso pseudo-requintado da ‘elite’ brasileira II

ou A indiscreta vulgaridade da burguesia


“A sociedade espetacular entronizou a imagem” (Juremir Machado da Silva)

Uma imagem vulgar transformada em ilusão épica pelo espetáculo midiático. Uma qualquer com pose de requintada desfilando nua em manifestação pela rua. Muitos passam a chama-la de ‘musa’. Se fosse pobre, chamariam ‘puta’. Outro caso: Socialite chapecoense vomita sua mágoa acima das cotas e programas sociais do governo federal, além de destilar um preconceito contra casais homoafetivos na tentativa de disfarçá-lo. Algo brutal, primitivo, ou melhor, medieval (perdoem-me primatas, vocês não eram tão estúpidos). Com sangue nos olhos ou ódio no coração, certa burguesia, certa elite brasileira, ao som do sertanejo universitário em um camaro amarelo (quer imagem mais tosca, brega ou cafona?), manifestam-se em um buzinaço, outrora, coisa de pobre. Outros batendo panelas em casa toda vez que o partido dito ‘dos trabalhadores’ se pronuncia pela televisão, enquanto a empregada doméstica prepara o jantar que a madame nunca soube fazer – ‘Ai Herman, que preconceito contra a classe alta que não sabe cozinhar!’ – alguém sussurra.  Um casal na rua (pois agora, só agora, manifestar na rua também é ‘elegante’), ela siliconada, cabelos oxigenados, coxas malhadas de academia, pele bronzeada artificialmente ‘a la latina’, rosto rebocado de plástica e cosméticos, anéis e brincos dourados e reluzentes, ele, bombado também de academia, tatuagens (outrora era coisa de marginal) e o cartaz com a frase: ‘Fora governo que sustenta nordestino vagabundo com a bolsa preguiça!’. Entre outras inúmeras manifestações ‘elegantes’ e ‘charmosas’. Vestidos ‘a la manifestação’ com roupas de grife, um tal ‘kit manifestante’ que custa em torno de R$ 170,00 (uma camiseta, um boné e um apito), preço de ‘irmandade’. Tudo em nome de uma democracia que eles dizem firmemente defender, mesmo gritando por uma tal ‘intervenção militar’. Horror a Cuba, Venezuela ou qualquer outra nação de cultura não eurocêntrica. Latinidade, nem falar! Coisa de povo sem instrução, dizem. Mas não abrem mão do exagero nas vestimentas, luxos, discursos, mediocridades. Pouca leitura, entre elas, muito autoajuda, revista Veja e outras futilidades. Muita televisão e algo de cinema. Filmes hollywoodianos de ação ou comédia romântica, em sua maioria. Música, além do sertanejo dito universitário, algo de MPB e música clássica, só para manter certa aparência e decorar os nomes dos compositores, além do funk ostentação que ouvem escondidos. Um mundo caracterizado pelas imagens, formas, aparências. Onde o chique é brega e o elegante cafona. Um mundo, sob tudo, pequeno, por mais que aparente ser grande (já que é da aparência que ele se sustenta). Parecer não significa ser. Um mundo onde o ter em excesso se iguala ao nada. Um mundo viral que morrendo, também mata. Eis a indiscreta vulgaridade de uma elite que já foi mais inteligente e teve lá seu charme, mas que hoje esbanja superficialidade e breguice. Eis a cultura e educação daqueles que comem caviar, mas arrotam sardinha.


* também publicado no jornal Gazeta de Chapecó.



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