sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Leituras do Cotidiano, 08/08


Os ‘especialistas’

“(...) a filosofia deve desfrutar de uma posição central nos processos educacionais que envolvem os jovens, e não ser este arremedo de filosofia que é encontrado nas escolas e nas universidades, estabelecimentos que privilegiam claramente conhecimentos particulares e específicos”.

Introduzo esta ‘análise crítica’ (continuação da anterior, publicada na edição passada deste mesmo jornal) com esta citação (acima) do filósofo alemão Friedrich Nietzsche. Seguindo a questão, Nietzsche critica as “disciplinas especializadas como sendo incapazes, por causa mesmo da sua natureza e limites, de lidar com os verdadeiros problemas da cultura, que são os problemas da existência. A divisão do trabalho científico e a ‘atomização do conhecimento’, segundo Nietzsche, traziam como resultado a ruptura entre conhecimento e civilização, unidade que somente a filosofia com sua visão de conjunto poderia realizar, integrando o conhecimento à vida, a cultura à natureza. Neste sentido, Nietzsche continua e critica as escolas por se terem transformado em ‘escolas profissionais’ e as universidades em ‘escolas especializadas’ - Por não terem “o menor compromisso com a cultura”, diz o filósofo. Sendo que, “a ‘sabedoria’ é algo diferente e superior a um específico saber científico”, assim como, “a cultura não deve estar a serviço, nem do Estado, nem da sociedade, nem da indústria, nem da ciência, nem da Igreja” (...). Nietzsche prossegue dizendo que o ‘especialista’ “se parece com um operário numa fábrica que, durante toda sua vida, não faz senão fabricar certo parafuso ou certo cabo para uma ferramenta ou uma máquina determinadas” (...), onde - “A divisão do trabalho nas ciências visa praticamente o mesmo objetivo que aquele a que visam conscientemente aqui e ali as religiões: a redução” (...). Ou seja, o mundo das ‘especialidades’ que é o mundo dos ‘especialistas’, é um mundo fragmentário, utilitarista, doutrinário, ideológico (segundo o dualismo), reducionista e quando não, determinista, sendo assim, nossa educação e cultura, estão voltadas pra isso. Exemplo vivo, volta e meia, sou subestimado e criticado por não me render a uma dita ‘única especialização’ ou ‘especialidade’. Muitos não compreendem a minha diversidade de práticas sociais e culturais, talvez por não conseguirem ver para além daquilo que se convencionou como ‘profissionalismo’ e ‘utilidade’. Não há uma filosofia, nem uma cultura ou educação amplas, livres e diversificadas nas suas possibilidades quando o pensamento e as práticas estão sob tutela dos ditos ‘especialistas’. Como diria o ‘filósofo maldito do Caos’ Hakim Bey: é preciso ‘nomadizar’, estar ou ir além, para, como pensa Nietzsche, possamos tratar das nossas pendengas, como das nossas virtudes, de forma ‘sincera’, quando diz: "Nossa filosofia deve aqui começar não pela admiração, mas pelo terror". Nisso, a grande questão da educação a partir do filósofo e/ou do educador está muito além da ideologia política, e não é doutrinar, direcionar ou especializar, mas, tomando mais uma vez as palavras de Nietzsche: “A primeira tarefa do professor é colocar seus alunos em guarda contra si mesmos”.

¨ Citações do livro: “Escritos sobre Educação”, de Friedrich Nietzsche.


* também publicado no jornal Gazeta de Chapecó.



Nenhum comentário: