Os ‘especialistas’
“(...) a filosofia deve desfrutar
de uma posição central nos processos educacionais que envolvem os jovens, e não
ser este arremedo de filosofia que é encontrado nas escolas e nas
universidades, estabelecimentos que privilegiam claramente conhecimentos
particulares e específicos”.
Introduzo esta ‘análise crítica’ (continuação da anterior, publicada
na edição passada deste mesmo jornal) com esta citação (acima) do filósofo
alemão Friedrich Nietzsche. Seguindo a questão, Nietzsche critica as
“disciplinas especializadas como sendo incapazes, por causa mesmo da sua
natureza e limites, de lidar com os verdadeiros problemas da cultura, que são
os problemas da existência. A divisão do trabalho científico e a ‘atomização do
conhecimento’, segundo Nietzsche, traziam como resultado a ruptura entre
conhecimento e civilização, unidade que somente a filosofia com sua visão de
conjunto poderia realizar, integrando o conhecimento à vida, a cultura à
natureza. Neste sentido, Nietzsche continua e critica as escolas por se terem
transformado em ‘escolas profissionais’ e as universidades em ‘escolas
especializadas’ - Por não terem “o menor compromisso com a cultura”, diz o
filósofo. Sendo que, “a ‘sabedoria’ é algo diferente e superior a um específico
saber científico”, assim como, “a cultura não deve estar a serviço, nem do
Estado, nem da sociedade, nem da indústria, nem da ciência, nem da Igreja”
(...). Nietzsche prossegue dizendo que o ‘especialista’ “se parece com um
operário numa fábrica que, durante toda sua vida, não faz senão fabricar certo
parafuso ou certo cabo para uma ferramenta ou uma máquina determinadas” (...),
onde - “A divisão do trabalho nas ciências visa praticamente o mesmo objetivo
que aquele a que visam conscientemente aqui e ali as religiões: a redução”
(...). Ou seja, o mundo das ‘especialidades’ que é o mundo dos ‘especialistas’,
é um mundo fragmentário, utilitarista, doutrinário, ideológico (segundo o
dualismo), reducionista e quando não, determinista, sendo assim, nossa educação
e cultura, estão voltadas pra isso. Exemplo vivo, volta e meia, sou subestimado
e criticado por não me render a uma dita ‘única especialização’ ou
‘especialidade’. Muitos não compreendem a minha diversidade de práticas
sociais e culturais, talvez por não conseguirem ver para além daquilo que se
convencionou como ‘profissionalismo’ e ‘utilidade’. Não há uma filosofia, nem
uma cultura ou educação amplas, livres e diversificadas nas suas possibilidades
quando o pensamento e as práticas estão sob tutela dos ditos ‘especialistas’.
Como diria o ‘filósofo maldito do Caos’ Hakim Bey: é preciso ‘nomadizar’, estar
ou ir além, para, como pensa Nietzsche, possamos tratar das nossas pendengas,
como das nossas virtudes, de forma ‘sincera’, quando diz: "Nossa filosofia deve aqui começar não pela admiração,
mas pelo terror". Nisso, a grande questão da educação a partir do filósofo
e/ou do educador está muito além da ideologia política, e não é doutrinar,
direcionar ou especializar, mas, tomando mais uma vez as palavras de Nietzsche:
“A primeira tarefa do professor é colocar seus alunos em guarda contra si
mesmos”.
* também publicado no jornal Gazeta de Chapecó.
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