'Silêncio' - Odilon Redon (1900)
Enquanto lá fora o vento sopra e bate na janela do meu quarto
escuro, eu em meu devaneio noturno prossigo buscando distâncias. Imagens me
surgem e em todas elas eu estou só. A solidão às vezes é a companheira mais
fiel. Ela não ludibria, não dissimula, não entorta, não agride, apenas silencia
e é. E eu abraço a solidão como quem abraça a si mesmo em frente ao espelho –
com toda a força e esperança contidas no ato. E o vento lá fora, teimoso,
continua a bater na janela do meu quarto escuro. Daqui um pouco o galo canta e
algo se move lentamente por detrás da montanha sobre a relva umedecida. A
solidão vai embora sempre que alguém bate a minha porta e eu me certifico de
que o mundo ainda não está vazio. No meu peito sobe uma ânsia que vem por causa
de um dia cheio de compromissos que não me dizem nada, mas que sei, é preciso
cumpri-los por uma determinação exterior a minha vontade. É o dia útil que
chega e se apodera da necessidade, tornando-a escrava dos seus mandos e
desmandos, a seu bel-prazer – o meu, volta com a noite, quando em meu quarto
escuro ouço o vento soprando e batendo na janela. Minha solidão tem janelas
para a noite...
* também publicado no jornal Folha do Bairro, em 24/05
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