“Literatura”:
Histórias
do Velho Oeste: Os incendiários!
Escapei do linchamento naquela noite de
primavera. Os companheiros do meu bando não tiveram a mesma sorte. Era outubro
de 1950 e eu me lembro como se fosse hoje. Depois de apanharem muito da
população revoltada, com suas carnes já dilaceradas, foram incendiados. Tonho
ainda estava vivo pelo que me contaram depois. Deve ter sofrido muito o
coitado. Fomos acusados de incendiários e éramos forasteiros. Nego as acusações
até hoje. Se bem que não sou tão confiável assim! Que culpa tínhamos nós pelas
garotas nos darem bola? Se arreganhavam todas quando nos viam passar em cima de
nossos cavalos bem encilhados. Éramos elegantes e tínhamos risos de vanguarda.
Bons tempos aqueles em que perseguíamos um ideal! Por mais que eu fosse
perigoso, nunca ateei fogo em igreja nenhuma. Sou devoto e jamais faria isso! O
desgraçado do delegado em comunhão com o padre, prefeito e outras autoridades,
fizeram corpo mole, deixando a populança nos agarrar. Queriam nos ver mortos, e
conseguiram. Mas eu sobrevivi. Talvez os imbecis não esperassem por isso.
‘Famílias nobres... ah! Que piada!’. Que nobreza há em atos como este? Eu andava
bem trajado e era gentil com os que fazia contato, principalmente com as
donzelas e raparigas. Andava armado, como os demais, costume da época, mas
nunca precisei puxar o gatilho, graças a Deus! Sou o quinto elemento de um
bando de amigos e companheiros de aventura, e o único sobrevivente. Minhas
cicatrizes são incuráveis e carrego sequelas que jamais serão reparadas. O
tempo passou e eu envelheci junto com minhas chagas que são eternas. Xapecó é
uma cidade de tradição incendiária. Hospitais, clubes e até igrejas foram
‘vítimas’ del fuego ao longo dos anos
por aqui. A maldita disputa por poder local fez vítimas e deixou um rastro de
sujeira e sangue na história do Oeste – e culpa foi lançada e transferida aos
indesejáveis e desprezados dessa ordem. Não é por nada que esta terra é também
conhecida como ‘Velho Oeste’. Muitos dos covardes desapareceram enquanto eu permaneço
– ainda estou aqui, incrustado nas pequenas decadências dessa cidade. Como uma
maldição, volta e meia sou lembrado – o tormento da moral local. Sou parte
nobre de uma história hedionda – o ‘pé no saco’ dos heróis que aqui foram
forjados. Minha vingança foi tornar eterna a lembrança da matança dos meus
comparsas. Estou vivo e me chamo Memória.
*
“Política?”:
E
os palhaços riem-se de própria desgraça...
Arma de plástico produzida em impressora
3D é o sonho do norte americano impotente e frustrado - e do brasileiro imbecil/reprodutor.
Os reprodutores partidários do ‘livre armamento’ e do discurso enfadonho,
hipócrita e demagógico da ‘legítima defesa’, comemoram essa invenção
tecnológica e banal. Ponto para a bestialidade...
Redução
da maioridade penal: muleta!
Sistema Penal: Universidade do crime -
Sistema Educacional: Presídio da segmentação. Escolha sua opção!
Aliciamento
de menores...
Quem paga não é a sociedade (ou o
acúmulo de riquezas e os exageros dela) como geralmente quer fazer entender o
discurso ideológico reacionário e retrógrado. Quem paga já é o jovem, o
adolescente, a criança, jogados a sorte pelo descaso e omissão do Estado e suas
instituições, muitas vezes, pela a omissão da família, da escola e do mundo
adulto.
Educação
penalizada...
Se o sistema judiciário e penal são
incapazes e/ou incompetentes e corruptos, como exigir da criança ou do
adolescente ‘boa conduta’? Onde há coerência nisso?
Covardia
e moralismo...
Reduzir a idade penal é um ato de
covardia do Estado e do mundo adulto. Essa redução acaba sendo uma
‘transferência’ das responsabilidades daqueles que são os principais agentes da
situação, acima dos que estão vulneráveis aos trâmites desse jogo moralista de
interesses particulares e estupidezes coletivas. Uma tentativa hipócrita de dar
uma resposta medíocre que conforte a sociedade e sua ordem vitimizada (e
violenta – para além da violência física, diga-se de passagem).
Limpeza
étnico-social?
Ação policial onde um helicóptero fez
chover balas numa favela deu sorte e acabou na morte do traficante. Esse fato
foi (é) reproduzido em massa na internet como sendo um ato heroico dos agentes
e do Estado. Mas isso porque foi numa favela, onde os desprestigiados dessa
ordem, desse sistema, estiveram em risco. Se fosse num bairro nobre, de ‘classe
média’ ou ‘alta’, certamente, muitos que estão na defesa dessa ação, não teriam
a mesma ‘opinião’. Isso demonstra certa hipocrisia dos reprodutores e uma
vontade de ‘limpeza étnico-social’, movido pela ignorância ou por um ódio
motivado, das ditas ‘classes’ média e alta aos mais pobres. E se fosse no seu
bairro, a chuva de balas furando suas paredes, você seria a favor?
* também publicado no jornal Gazeta de Chapecó - 17/05
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