quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Leituras do Cotidiano - 03/10


Envelhecimentos...















Em uma visita sem previsão, volto para a universidade em que me graduei e sinto o cheiro de mofo que visualizo incrustado em tudo o que não sou eu. Os corredores estão cheios de um vazio tão grande, e finalmente não sinto a nostalgia que consome o tempo. A brisa vem e trás consigo um cheiro de hospital que me faz sentir um moribundo. Aquele conhecimento que ainda se promove envelheceu e adoeceu. A academia envelheceu (e com ela o conhecimento) e adoeceu, assim como sua função -  como certa educação, o pensamento, a ideia, a razão. Caminho mais um pouco e vejo paredes de um branco hospitalar onde a senilidade faz residência. O olhar de alguns daqueles mestres ou professores envelheceu e adoeceu, assim como seus conceitos, concepções, ideologias, discursos, formas e práticas. Abandono os corredores frios da universidade e ganho a rua, onde um calor e uma sensação de vida me arrebatam e devolvem o pouco sorriso que ainda me resta. É pouco, mas verdadeiro pelo menos, e hoje, isso é muito. Encontro alguns amigos antigos e eles também envelhecem junto as suas dores, frustrações, vaidades, egos, suas formas, seus modos, suas desistências. Olhares internos que perderam suas profundidades, e que me miram como miram a um estranho ou algo que já não mais os faz com-sentir – a amizade decerto tornou-se uma simples alegoria -  teria ela envelhecido? A imagem é triste e eu prefiro a embriaguez de um dia que envelheceu e, mais que adoecer, daqui a pouco vai morrer – e que venha o novo dia! Contudo, também envelheço, mas desta vez, só fisicamente, pois minha alma continua renascendo, a cada escuro dos dias, das horas, minutos e segundos, assim como meus pensamentos, ideias e vontades. Não amigos, eu não vos abandonei, pois não abandonei essa casa velha onde estou guardado. Um incansável na persistência de ainda ser e sentir. Pode até ser que um dia eu também envelheça junto ao meu corpo e assim você me chame tapera, mas, enquanto encontrar vistas para as possibilidades, é assim que farei. Perdão se não envelheci com vocês, ainda não possuo essa capacidade.

“O poeta – o contemporâneo – deve manter fixo o olhar no seu tempo. (...) contemporâneo é aquele que mantém fixo o olhar no seu tempo, para nele perceber não as luzes, mas o escuro.” (Giorgio Agamben)


* também publicado no jornal Gazeta de Chapecó, 03/10




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