Acordei com uma dor terrível na cabeça. Lá fora, o mundo em
chamas. Pulei da cama para ver o espetáculo. Era tudo o que os jornais e a
televisão queriam, desde que ficassem vivos. Mas não foi dessa vez. Deus foi
impetuoso. Não poupou nada nem ninguém. Os arautos do poder tiveram náuseas e
viram seu mundo espetacular ruir. Corporações jornalísticas e emissoras de
rádio e tevê enfartaram junto aos seus demagogos e sensacionalistas repórteres
e apresentadores, o que tornou o espetáculo ainda maior. Até o homem do tempo e
a mulher do social enfartaram enlouquecidos. Agora sim o espetáculo teria boas
razões de ser. E eu, do alto do meu sobrado, vi tudo com desdém e certo cinismo
e muito sarcasmo: ‘Não era isso o que queriam seus imbecis?! Aí está o seu
circo! Agora, divirtam-se!’. Para meu deleite ser ainda maior, abri a geladeira
e a última cerveja gelada da minha ínfima existência. A mais saborosa de todas
as cervejas já tomadas por um homem na face da terra. Vivi estava deitada,
ainda sonolenta e com as pernas abertas. A noite fora estrondosa, tanto que
silenciou as explosões que aconteciam lá fora. De pé, bebericando meu último
trago, senti as mãos de Vivi nos meus ombros. Ela de calcinha e eu de cueca,
como haveria de ser. Lembrei-me de um outro filme de caos que tanto gostava. Um
final digno de cinema para dois personagens dignos de uma vida anônima. Abracei
Vivi e destilei meu ultimo beijo aromatizado pela cerveja nela. Um fim
espetacular para uma vida intensa. Era tudo o que eu queria.
* também publicado no jornal Folha do Bairro, 24/01
(aos amigos Zé Boita e Marciano J. Maraschin, com carinho!)
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