‘Esquerdistas’
contra Nietzsche
Não é a primeira
vez que me deparo com a velha, distorcida, fragmentada, determinista,
reducionista, ideológica e péssima leitura e interpretação do pensamento de
Nietzsche por alguns ‘intelectuais’ ditos de esquerda. Na revista digital
Gabrois, publicação vinculada ao PCdoB, do dia 25 de julho, um texto intitulado:
‘Marx e Nietzsche diante da modernidade capitalista’, assinado por Augusto Buonicore, traz uma
tentativa de ‘interpretação’ (que acaba sendo uma ‘distorção’) do pensamento e
figura de Nietzsche. Parece que, o que muitos ideólogos ‘esquerdistas’ ainda
não aprenderam, talvez por não estudarem o suficiente o pensamento daqueles os
quais se opõem, é que, além de Marx (um dos maiores pensadores sociais que o
mundo já teve), existem outros dignos de atenção e interpretação. O texto do
Sr. Buonicore é medíocre, no sentido de, claramente ser um descarrego
ideológico contra algo que o autor parece mal conhecer (e se conhece, pior
ainda!). Nisso, percebo, e não é a primeira vez, certa alergia com a palavra
‘aristocrata’ por parte de alguns idealistas marxistas (ou platônicos? ‘Niti’
assim diria, certamente!). Quando 'Niti' fala do 'aristocratismo', não é a partir do desprezo a
outras formas ou classes, como o texto do Sr. Buonicore faz parecer, mas é do
ponto de vista 'cultural'. Ou seja, um espécie de 'apologia' a uma 'cultura' mais 'esclarecida', aprofundada, pensante (que era a
aristocrata naquele período - inclusive Engels, parceiro de Marx, vinha dela),
isso, inclusive, aplicado ao popular, e não na 'popularização ideológica
doutrinária' dos conteúdos e bens produzidos pela sociedade a partir de
interesses privados ou de Estados, sejam eles capitalistas ou socialistas. Em
suma, a grande questão de ‘Niti’ era contra o idealismo (o que chamava de
‘muleta’) que, para ele, predomina(va) tanto no cristianismo quanto nos
socialismos. O 'idealismo platônico' (usado pela Igreja medieval),
caracteriza(va) parte significativa das ideologias ditas 'sociais', na crença
de um 'futuro melhor' (o paraíso), bem o oposto do que o texto do Sr. Buonicore
traz de 'Niti'. Ao contrário do que se diz no texto, quem faz 'guerra' entre Marx
e Nietzsche, não é nem Marx nem 'Niti', mas alguns dos seus 'leitores'. Quando
'Niti' refere-se ao 'ser guerreiro', usa ele próprio como exemplo, pois se
coloca dentro da sua filosofia, sendo 'ele mesmo', seu 'eu', um 'personagem' de
sua obra que, diga-se de passagem, tinha mais de uma única voz - leia-se Ecce
Homo, a exemplo). O seu 'eu guerreiro' tinha relações com a filosofia oriental
e pré-socrática, a qual era especialista. Portanto, não pode ser localizado sob
a ótica 'dualista' judaico-cristã (mesma do texto). Por fim, convenhamos, 'Niti'
não escrevia receituário. Era filólogo e filósofo, estudioso de antigas
escrituras, na sua luta assídua contra os 'idealismos' que escravizam,
mediocrizam e reduzem a vida a uma fórmula de compensação.
* também publicado no jornal Gazeta de Chapecó.
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