quinta-feira, 21 de julho de 2011

O esporte mata!

(parte I)

Anos atrás caiu em minha mão um texto do médico José Róiz, que depois fiquei sabendo, era o nome de um livro seu que levava o título: “O esporte mata!”. O médico dizia coisas corajosas nesse tempo de supervalorização do esporte, da imagem, do culto ao corpo, como "O homem não foi feito para correr”. Mas não pensem que fazia como fazem alguns arautos do esporte competitivo que enriquece uma minoria e infecta a maior parte do espaço midiático, tratando o tema superficialmente, visando apenas audiência e/ou lucros. Róiz fundamentava suas teses, sendo médico e pesquisador. Volta e meia, algum aluno me pergunta: ‘Você torce para algum time de futebol professor?’. ‘Torço... Torço para que o futebol acabe!’. Mas não aquele futebol popular, jogado nos terrenos baldios ou campinhos e quadras mundo afora, mas esse futebol ‘espetacular’, de disputa (do ‘pão e circo’), que engorda cofres de muitos ‘mafiosos’ por aí, além de criar ícones e/ou ídolos, ‘heróis semideuses’ de uma realidade nacional mesquinha que concentra renda nas mãos destes, enquanto muitos trabalhadores passam por necessidades básicas dentro do mesmo país. Muitos dos meus alunos questionam os motivos de eu torcer pela seleção argentina no futebol, e quando isso acontece, simplesmente digo que é por causa do Maradona e do que ele simboliza: um homem de carne e osso, devido aos seus ‘deslizes’, além de ter sido um grande jogador. Pelé, ‘o rei’, representa uma suposta ‘pureza’, um exemplo vivo do desportista saudável, idealizado, enquanto Maradona é o real, o homem além do ‘trono’, da ideologia mentirosa que inventa um super-herói que deve servir de exemplo.  No Brasil, geralmente quando se comemora um gol, ou quando um jogador dá entrevistas, o pagode ou o sertanejo universitário são o fundo musical. Dias atrás, num jogo da Copa América pela televisão, em meio à torcida, uma enorme bandeira argentina trazia escrito em letras gigantescas: ‘Rock’. Ta aí mais um motivo para a minha simpatia ser maior pelo futebol de los hermanos.  Mas não é só no futebol que esse ‘encantamento alienante’ da massa acontece. Outros esportes ‘iconizados’, geradores de grandes lucros e vinculados pela grande mídia, também servem de instrumento de manobra da massa. Porque na televisão, jornais e revistas, o esporte tem um grande espaço, enquanto outras manifestações culturais, como literatura e música, tem seus espaços reduzidos? 

(parte II)

Depois de ter escrito e publicado a primeira parte desta crônica (que na verdade são duas – mas isso pouco interessa), e ter recebido alguma(s) critica(s) sobre ela(s) - e alguns elogios, estou cá novamente para terminar com ela(s). De fato o tema é polêmico. E como não haveria de ser, já que estamos falando de algo quase ‘intocável, irredutível’, algo priorizado, elevado ao status supremo e maior (aqui no Brasil pelo menos)? Embora eu tenha deixado claro de que tipo de esporte eu estava falando na ‘parte I’, ainda tiveram aqueles que se revoltaram. Desportistas? Fanáticos? Não sei. Se bem que o tipo de esporte do qual eu me refiro é predominante nos meios: o de disputa, de competição, que gera status e grandes lucros, e que é utilizado ideologicamente para um convencimento, uma manutenção, uma manipulação. Além do já ‘clássico’ futebol, existem os modismos. Nas principais páginas da internet, lá estão eles. E mesmo que você não queira saber deles, no mínimo é obrigado a ver. Futebol, Fórmula 1, 2, 3, 4, Vôlei, Basquete, Vale Tudo, Vale Nada, etecétera... (este último não é um esporte!). Eu, criticando assim, até parece que não gosto de nada, não é? Até gosto, mas vejo ‘esse esporte’ além da mera atividade física. Vejo nisso o alimento de um ego, um eu-imagem idealizado, a ideologização de uma saúde inventada, dos corpos ‘perfeitos’. O homem sendo devorado pela imagem – imagem daquilo que não se é. Além do classicismo metafísico-filosófico, o culto ao corpo, ao esporte de competição, são heranças da Grécia antiga. E o mesmo esporte que mata - não só o corpo - mata também outras possibilidades de outras ‘artes humanas’ terem seu espaço, quando ele ocupa quase todos, como uma infecção generalizada, um fungo, uma bactéria. Efeitos? Muitos: ‘fabricação de ídolos e ícones; reprodução de valores individualistas e de status social como disputas, concorrência, sede de vitória; frustração quando se perde ou não se supera o que foi idealizado: tapeação da realidade. Mas eu também, raramente, jogo minha bolinha, meu carteadinho. Mas isso nem de longe é a mesma coisa. No lugar do esporte, queria ver pela televisão ou nas páginas dos jornais, mais arte e cultura. Depois dos 40 anos de idade, são raros os atletas saudáveis. Maltrataram tanto o corpo condicionando-o para competições que acabam tortos. Enfim. Posso um dia até morrer pela falta de esporte. Mas jamais morrei por ele.


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